TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

288 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL litígio, desistindo do pedido ou transigindo com o alegado empregador, inclusive no sentido da existência de contrato de prestação de serviços. Diferentemente, de acordo com a interpretação do tribunal a quo, na ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, o alegado trabalhador não pode dispor do objeto da ação, transigindo com o alegado empregador no sentido de que a relação contratual existente entre ambos é de prestação de serviços. Conclui a recorrente que esta diferença de tratamento normativo de duas situações idênticas, que recla- mam a mesma proteção, constitui resultado ofensivo do princípio da igualdade de tratamento, previsto no artigo 13.º, n.º 1, da Constituição, determinando a inconstitucionalidade da norma do artigo 186.º-O, n.º 1, do CPT, na interpretação aplicada pela decisão recorrida. No referido Acórdão n.º 94/15 este Tribunal foi chamado a apreciar a conformidade do regime da ação de reconhecimento de existência de contrato de trabalho com o princípio da igualdade, concretamente, por a decisão aí recorrida ter entendido que este regime estabelece uma regulamentação completamente distinta e muito mais favorável do que a regulamentação que se encontra fixada para a ação declarativa comum, cujo objeto e pedido (pelo menos, o principal) é exatamente o mesmo, considerando existir uma diferenciação injustificada e desproporcional entre os regimes destes dois tipos de ação, cuja finalidade é exatamente a mesma, ao que acresce o facto de se conferir uma proteção e tutela jurídica e processual maior e mais favo- rável numa situação em que não existe conflito entre as partes, em comparação com a proteção conferida na situação em que tal conflito existe e é real e que, por isso, seria mais urgente solucionar. No mencionado Acórdão n.º 94/15 o Tribunal entendeu não existir violação do princípio da igualdade, com a seguinte fundamentação: «A proibição do arbítrio constitui um limite externo da liberdade de conformação ou de decisão dos poderes públicos, servindo o princípio da igualdade como princípio negativo de controlo. No entanto, importa realçar que a vinculação jurídico-material do legislador ao princípio da igualdade não elimina a liberdade de conformação legislativa, pois a ele pertence, dentro dos limites constitucionais, definir ou qualificar as situações de facto ou as relações da vida que hão de funcionar como elementos de referência a tratar igual ou desigualmente. Significa isto que só existirá infração ao princípio da igualdade quando os limites externos da discricionariedade legislativa sejam violados, isto é, quando a medida legislativa adotada não tenha adequado suporte material. Ou seja, a teoria da proibição do arbítrio não é um critério definidor do conteúdo do princípio da igualdade, antes expressa e limita a competência de controlo judicial. Trata-se de um critério de controlabilidade judicial do princípio da igualdade que não põe em causa a liberdade de conformação do legislador ou a discricionariedade legislativa. A proibição do arbítrio constitui um critério essencialmente negativo, com base no qual são censurados apenas os casos de flagrante e intolerável desigualdade. Definidos assim os contornos do princípio da igualdade nesta dimensão, importa agora apreciar se o mesmo se mostra violado pelas normas cuja aplicação foi recusada pela decisão recorrida. Como vimos, a «ação de reconhecimento de existência de contrato de trabalho» tem subjacente um procedi- mento prévio (previsto no artigo 15.º-A da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro), em que, tendo sido verificada a existência de indícios de uma situação de prestação de atividade, aparentemente autónoma, em condições análogas às de um contrato de trabalho, e na falta de regularização da situação pela entidade empregadora, a ACT remete participação dos factos para os serviços do Ministério Público para fins de instauração de ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho. Ou seja, esta ação tem na sua base uma verificação prévia por parte de uma entidade pública (a ACT), a quem foram atribuídas competências para o efeito, da existência de indícios de uma situação de qualificação fraudulenta (e legalmente proibida) de um determinado contrato como tendo uma natureza diferente de um contrato de trabalho, com o objetivo da subtração da relação em causa ao regime laboral, causando-se com isso prejuízo ao trabalhador e ao Estado. Por outro lado, a intervenção do Estado neste âmbito tem, como vimos, subjacentes diversas razões de interesse público, que levam a que o Estado proceda a um escrutínio (e mesmo à punição) das situações em que se pretenda,

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