TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
287 acórdão n.º 85/16 os das partes, o facto de os direitos em causa não poderem ser objeto da aludida transação, não impede o putativo trabalhador de manifestar a sua posição e fazer valer nos autos as suas razões, no sentido de que o contrato em causa não deve ser qualificado como um contrato de trabalho subordinado, designadamente, tomando posição quanto às circunstâncias concretas em que desenvolve a sua atividade (invocando, por exemplo, as razões pelas quais se pretendeu vincular num regime que não o do contrato de trabalho) e car- reando para o processo os elementos que entenda pertinentes para sustentar essa posição, de modo a que o tribunal possa apreciar a situação e, em conjunto com os demais elementos probatórios, extrair uma conclu- são quanto à qualificação do tipo de contrato em causa. É certo que, de acordo com a interpretação do tribunal a quo, o putativo trabalhador, neste tipo de ação, não terá o direito de transigir no que respeita à qualificação do contrato. Contudo, esta é apenas uma das diversas faculdades que a tramitação processual normalmente faculta às partes para manifestar a sua posição e demonstrar qual a sua vontade. Contudo, sendo também claro, conforme se referiu, que nesta matéria não estão envolvidos interesses exclusivamente privados, não é destituída de sentido a posição de considerar excluída a possibilidade de transação nos termos expostos, na medida em que tal impediria o tribunal de averiguar qual a natureza da relação jurídica em causa. Com efeito, em geral, nestas situações, o alegado trabalhador e a respetiva entidade patronal, já haviam qualificado o contrato firmado entre ambos como “contrato de prestação de serviços” e, não obstante essa qualificação, tendo a Autoridade para as Condições do Trabalho recolhido indícios da existência de um con- trato de trabalho subordinado, há lugar, nos termos já referidos, à instauração da ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho. Daí que, a ser permitida a possibilidade de extinguir o processo através de transação em que as partes do aludido contrato se limitem a confirmar a referida qualificação, resultaria completamente inutilizada a razão de ser deste tipo de ação, que perderia qualquer utilidade prática. Face ao exposto, não se afigura que o regime da ação de reconhecimento de existência de contrato de trabalho viole o direito de ação e o direito a um processo equitativo, consagrados no artigo 20.º, n. os 1 e 4, da Constituição. 2.3. Da violação do princípio da igualdade Segundo a recorrente, a interpretação normativa sindicada é inconstitucional também por violação do princípio da igualdade, a partir da comparação das correspondentes soluções legais com as previstas em sede de processo laboral comum e, bem assim, com as aplicáveis aos trabalhadores cuja atividade não seja abran- gida por ação inspetiva da Autoridade para as Condições do Trabalho. Alega a recorrente que se verifica uma situação de desigualdade injustificada entre a situação de putativo trabalhador que conhece a intervenção inspetiva da Autoridade para as Condições do Trabalho e aquele que, na mesma situação material, não é por ela abrangido. Na sua alegação, de acordo com a interpretação do tribunal recorrido, a primeira situação desencadeará oficiosamente um meio de tutela jurisdicional, em que a posição do Ministério Público prevalece sobre a vontade das partes na relação material controvertida, sendo, por isso, irrelevante qualquer manifestação de vontade destas no sentido da existência de vínculo de prestação de serviços. Nesse caso, sustenta a recorrente, ainda que nenhuma das partes na relação contratual pretenda manter contrato de trabalho, pode vir a ser declarada a existência entre ambos de um vínculo dessa natureza, por via de ação proposta por terceiros, mas cujos (únicos) efeitos se projetam na esfera jurídica daquelas. Em circunstâncias idênticas, continua a recorrente, um prestador de serviços cuja situação não tenha sido objeto de intervenção da Autoridade para as Condições do Trabalho, não verá a sua situação contratual modificada por via da intervenção de terceiro, alheio ao contrato, sendo esta apenas suscetível de alteração caso o mesmo o pretenda (propondo, para o efeito, ação declarativa, em processo comum). No âmbito de ação com processo comum instaurada pelo putativo trabalhador, no qual este formula pedido de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, pode este dispor livremente do objeto do
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