TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
283 acórdão n.º 85/16 da contestação, simultaneamente «com a expressa advertência de que pode, no prazo de 10 dias, aderir aos factos apresentados pelo Ministério Público, apresentar articulado próprio e constituir mandatário» e o artigo 186.º-O, também do Código de Processo de Trabalho prevê, no seu n.º 1, que «[s]e o empregador e o trabalhador estiverem presentes ou representados, o juiz realiza a audiência de partes, procurando conciliá-los». Independentemente das eventuais deficiências técnicas deste regime apontadas pela decisão recorrida (matéria sobre a qual não compete ao Tribunal Constitucional pronunciar-se), a verdade é que o mesmo garante a interven- ção nos autos, quer do trabalhador, quer da entidade empregadora, sendo facultada ao trabalhador, a oportunidade processual de tomar posição quanto às circunstâncias concretas em que desenvolve a sua atividade, podendo, além do mais, invocar que se pretendeu vincular num regime que não o do contrato de trabalho (designadamente, por não querer estar sujeito a nenhuma relação de subordinação jurídica ou por estar vinculado a uma relação jurídica de um específico tipo contratual que não lhe permite ter outra relação jurídica de natureza laboral). Face ao exposto, não se nos afigura que o regime da «ação de reconhecimento de existência de contrato de tra- balho» viole a liberdade de escolha de profissão, consagrada no artigo 47.º, n.º 1, da Constituição, concretamente na dimensão em que consagra o direito de escolher o regime de trabalho. […]». No caso dos autos, a recorrente sustenta que a decisão recorrida, ao interpretar a norma do 186.º-O, n.º 1, do CPT, no sentido apontado, preconiza um entendimento que é contrário ao sustentado pelo Tribu- nal Constitucional no citado Acórdão. Contudo, não lhe assiste razão. No referido Acórdão entendeu-se que o regime da ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, previsto nos artigos 26.º, n.º 1, alínea i) , e 186.º-K a 186.º-R, todos do CPT, não violava a liber- dade de escolha de profissão, consagrada no artigo 47.º, n.º 1, da Constituição, concretamente na dimensão em que consagra o direito de escolher o regime de trabalho. Desde logo, importa salientar que no âmbito do Direito do Trabalho o princípio da autonomia privada não tem a mesma amplitude que no Direito Civil. A este respeito, António Monteiro Fernandes ( Direito do Trabalho, 16.ª edição, Almedina, Coimbra, 2012, pp. 22-23), sustentando uma posição que é comum na doutrina, refere o seguinte: «O Direito do Trabalho apresenta-se, assim, ao mesmo tempo, sob o signo da proteção do trabalhador e como um conjunto de limitações à autonomia privada individual. O contrato de trabalho é integrado por uma conste- lação de normas que vão desde as condições pré-contratuais, passam pelos direitos e deveres recíprocos das partes, atendem com particular intensidade aos termos em que o vínculo pode cessar, e vão até aspetos pós-contratuais (como a preferência na readmissão e a abstenção de concorrência). É, pois, traço de caráter do Direito do Trabalho a desvalorização da estipulação individual das condições de trabalho – a chamada “individualização” do conteúdo da relação de trabalho. Se a liberdade formal do candidato ao emprego é pressuposto do contrato, como meio de acesso ao trabalho livre – com exclusão do trabalho forçado, servil ou compelido –, a verdade é que a liberdade de estipulação está, pelo lado do trabalhador, originariamente condicionada. As condições do contrato, na medida em que se encontram na disponibilidade dos contraentes, são, em regra, ditadas pelo empregador, a quem cabe, também, a iniciativa do processo negocial e, depois, já na fase de execução do contrato, a determinação concreta da posição funcional do trabalhador. A atuação do Direito do Trabalho visa enquadrar, através de um sistema de limitações imperativas, o protagonismo do empregador na definição dos termos em que a relação de trabalho se vai desenvolver.» Em sentido semelhante, sustentando que a autonomia dogmática do Direito do Trabalho se alicerça em «princípios ou valorações materiais subjacentes ao sistema normativo laboral» que se diferenciam dos princípios subjacentes ao Direito Civil, Maria do Rosário Palma Ramalho refere que é «inevitável o reco- nhecimento da autonomia dogmática do direito do trabalho, porque subjacentes aos diversos institutos e
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