TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
277 acórdão n.º 85/16 analisadas, no acórdão transcrito, questões de constitucionalidade semelhantes às que estão em causa nos presentes autos, conforme considerou também o próprio tribunal recorrido, quando transpôs essa funda- mentação para a decisão do litígio que lhe foi presente. Por outro lado, o fundamento da improcedência do recurso decidido pelo Tribunal da Relação do Porto foi precisamente o entendimento de que o disposto no artigo 186.º-O, n.º 1, do Código de Processo do Tra- balho, não permitia na ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, aos putativos trabalhador e empregador dispor do objeto do litígio, acordando, em sede de audiência de partes, que a rela- ção jurídica existente entre ambos é de prestação de serviços, tendo para isso se socorrido da argumentação utilizada noutro acórdão da mesma Relação que tinha concluído pela inadmissibilidade duma desistência do pedido pelo putativo trabalhador em idêntica ação. Verificados os pressupostos necessários ao conhecimento do objeto do presente recurso, resta apreciar o seu mérito 2. Do mérito do recurso O objeto do presente recurso é a norma do artigo 186.º-O, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho (CPT), introduzido pela Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto, que aprovou a ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, interpretada no sentido acima referido. Segundo a recorrente, a referida norma constante do artigo 186.º-O, n.º 1, do CPT, na referida inter- pretação, adotada pelo Acórdão recorrido, viola os princípios da liberdade de escolha do género de trabalho e do direito de ação, previstos, respetivamente, nos artigos 47.º, n.º 1, e 20.º, n. os 1 e 4 da Constituição e, bem assim, os princípios da igualdade e do direito a um processo equitativo, previstos respetivamente nos artigos 13.º, n.º 1, e 20.º, n.º 4, da Constituição, uma vez que tal interpretação determina que não esteja na disponibilidade dos sujeitos da relação material controvertida transigir, em sede de audiência de partes, no sentido de que esta relação é de prestação de serviços, pondo, assim, termo ao processo. Daqui resulta, ainda segundo a recorrente, que pode ser declarada a existência de contrato ( in casu , de trabalho) sem vontade de nenhum dos contraentes, interpretação que não respeita o sentido do texto legislativo, sendo incoerente com as soluções previstas pelo sistema jurídico para situações semelhantes e conduzindo a resultados distintos para pretensões iguais, sem justificação adequada. Antes de apreciar se a interpretação normativa sindicada viola os referidos parâmetros constitucionais, importa, para melhor análise das questões de constitucionalidade, proceder a um enquadramento das altera- ções legislativas introduzidas pela Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto. Tal enquadramento foi efetuado no Acórdão n.º 94/15, proferido por esta 2.ª Secção (acessível em www.tribunalconstitucional.pt , tal como os restantes acórdãos do Tribunal Constitucional que a seguir se referem sem outra menção expressa), no qual se apreciou a inconstitucionalidade do regime normativo introduzido pela referida Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto. Escreveu-se o seguinte, a esse respeito, no mencionado Acórdão: «Esta lei [Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto], conforme consta do seu artigo 1.º, teve como propósito instituir «mecanismos de combate à utilização indevida do contrato de prestação de serviços em relações de trabalho subor- dinado». Tendo em vista esse objetivo, criou um procedimento administrativo da competência da Autoridade para as Condições do Trabalho (previsto no 15.º-A da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, aditado pelo artigo 4.º da referida Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto), bem como uma nova ação judicial (a ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho), que passou a integrar o conjunto das ações enumeradas no artigo 26.º, estando a sua tramitação prevista nos artigos 186.º-K a 186.º-R do Código de Processo do Trabalho, aditados pelo artigo 5.º da referida Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto. Este último diploma teve a sua origem no Projeto de Lei n.º 142/XII, resultante de iniciativa legislativa de cidadãos, em cuja exposição de motivos constava o seguinte:
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=