TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

271 acórdão n.º 85/16 A recorrente apresentou alegações, tendo formulado as seguintes conclusões: «1.º O presente recurso tem por objeto o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 26 de maio de 2015, que interpretou e aplicou a norma jurídica contida no artigo 186.º-O, n.º 1, do CPT, em violação dos princípios da liberdade de escolha do género de trabalho e do direito de ação e, bem assim, dos princípios da igualdade e do direito a processo equitativo. 2.º A dimensão normativa extraída do referido preceito legal, cuja conformidade constitucional se pretende ver apreciada, é aquela que resulta da interpretação do mesmo no sentido de não ser permitido aos putativos traba- lhador e empregador dispor do objeto do litígio, acordando em sede de audiência de partes que a relação jurídica existente entre ambos é de prestação de serviços, donde resulta que ao Ministério Público é reconhecido direito autónomo de prosseguimento da ação, alheio e contrário aos interesses privados que estão na origem da celebração do contrato sujeito a qualificação e, bem assim, à posição assumida pelos putativos trabalhador e empregador na referida audiência de partes (cfr. requerimento de interposição de recurso). 3.º No acórdão recorrido, o Tribunal da Relação do Porto julgou inválida a transação efetuada, em sede de audiência de partes, pelos putativos trabalhador e empregador, no sentido de que a relação jurídica existente entre ambos é de prestação de serviços. 4.º Fê-lo com fundamento em que na tentativa de conciliação, prevista no artigo 186.º-O, n.º 1 do CPT, não é permitido ao putativo trabalhador e ao putativo empregador dispor do objeto do litígio, por estarem alegada- mente em causa na ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, a que se reporta a Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto, interesses públicos prosseguidos pelo Ministério Público e não interesses privados dos titulares da relação contratual em causa e por esta ação ter sido interposta pelo Ministério Público, assumindo este a posição de autor. 5.º Daí resultando que o Ministério Público pode prosseguir ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho (ação de simples apreciação positiva que se limita a declarar a existência de direito ou facto jurídico), em oposição à vontade e interesse livremente manifestada pelos alegados empregador e trabalhador, na audiência de partes prevista no artigo 186.º-O, n.º 1 do CPT. 6.º A consagração no processo do trabalho da ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho constituiu instrumento para enfrentar a tendência para a fuga ilícita ao Direito do Trabalho, por via da contratação de falsas prestações de serviços. 7.º A referida ação não visa prosseguir interesse público, de toda a coletividade, mas conferir a cada putativo trabalhador outro meio para a obtenção da tutela legal que lhe é devida, com eficácia acrescida por efeito de trami- tação processual mais célere e do patrocínio pelo Ministério Público. 8.º Uma vez iniciada a instância, o interesse protegido em cada ação de reconhecimento da existência de con- trato de trabalho é o do sujeito da concreta relação jurídica em apreço. 9.º Assim sendo, o titular do interesse processualmente protegido e autor da ação é o putativo trabalhador, cujo contrato de trabalho pretende ver reconhecido. 10.º A ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho é de simples apreciação positiva, estando o objeto do processo limitado à qualificação do vínculo contratual. 11.º Atento aquele objeto, a decisão do processo apenas produz efeitos entre as partes da relação contratual a qualificar, dela não decorrendo consequências jurídicas para outras relações jurídicas conexas com o trabalho autónomo ou subordinado, designadamente de natureza tributária ou previdencial. 12.º Da atribuição ao Ministério Público de legitimidade para intentar a ação não resulta que esta prossiga interesse público que se deva sobrepor ao interesse privado dos titulares da relação jurídica objeto de qualificação, bem como que o Ministério Pública assuma a posição de autor da ação, com os corolários (i) do papel meramente acessório ou de assistência do putativo trabalhador e (ii) da subordinação da vontade deste à posição prevalecente do Ministério Público. 13.º Pelo contrário, o alegado trabalhador é notificado da petição inicial e da contestação, podendo tomar posição sobre o litígio, apresentando articulado próprio (artigo 186.º-L/4 do CPT).

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