TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

260 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ou onera intoleravelmente a livre escolha de outra profissão, a mesma é materialmente inconstitucional por vio- lação direta do artigo 47.º, n.º 1 da Constituição (direito fundamental de escolha de profissão), na dimensão do direito a não se manter no exercício de uma função ou a não ser obrigado a exercer determinada profissão, e na dimensão positiva de escolher uma outra função profissional, saindo violado o núcleo essencial deste direito fundamental. B) A norma do artigo 49.º do RLSM, interpretada no sentido de estabelecer uma garantia do cumprimento do contrato, que pode traduzir-se na fixação de um montante indemnizatório de valor cem vezes superior ao ven- cimento mensal do contratado, e cerca de duas vezes superior à totalidade dos vencimentos que auferiu durante o período do seu contrato, a título de ressarcimento dos custos envolvidos na formação ministrada, tendo em conta a expectativa da afetação funcional do militar, viola o núcleo essencial do direito de livre escolha de pro- fissão reconhecido no artigo 47.º, n.º 1 da Constituição, tendo em conta o valor fixado para a indemnização, inibidor da possibilidade de mudar de profissão.  C) A norma do artigo 49.º do RLSM padece de inconstitucionalidade orgânica porque carece de lei habilitante nos termos do artigo 165.º, n.º 1, alíneas b) e t) , da Constituição, de acordo com o qual a regulação de matéria que respeita ao regime dos direitos, liberdades e garantias (e sobretudo a restrição de direitos fundamentais, no caso, de liberdade de escolha de profissão), está incluída no âmbito da reserva de competência relativa da Assembleia da República.  D) A norma do artigo 49.º do RLSM é materialmente inconstitucional por operar uma restrição do direito funda- mental à escolha de profissão que não respeita nenhum dos critérios das leis restritivas dos direitos fundamen- tais (artigo 18.º, n.º 2, da Constituição): nomeadamente porque não existe lei da Assembleia da República que autorize a restrição, porque viola o princípio da proporcionalidade em sentido estrito (na medida em que não pondera devidamente todos os valores constitucionais em presença, como o do direito ao trabalho, tendo em conta o regime contratual precário do recorrente) e o princípio da proibição do excesso (tendo em conta o valor da indemnização fixada), e finalmente porque relega para o exercício discricionário da função administrativa (para um despacho do membro do Governo responsável pelas Forças Armadas) os termos da restrição de um direito fundamental. E) A norma do artigo 49.º do RLSM, interpretada no sentido em que permite à Administração definir a indem- nização ali prevista fixando a título de indemnização 50% das quantias recebidas pelo militar a título de ven- cimentos e de alimentação, viola a “garantia do mínimo” do direito à retribuição, reconhecido no artigo 59.º, n.º 1, alínea a) , da Constituição, conduzindo à absoluta erradicação deste direito, visto ter habilitado a que fosse exigido ao militar ora recorrente uma imdemnização de valor total superior à totalidade do que auferiu, a título de vencimento, durante todo o período do seu contrato.» (fls. 1026 a 1028) 3. Notificado para o efeito, o recorrido Ministério da Defesa Nacional veio apresentar as contra-alega- ções, das quais extraiu as seguintes conclusões: «(…)  1.º A dimensão condicionante de deferimento da rescisão contratual do militar com o pagamento da justa indemnização advém, não do artigo 49.º do RLSM, mas sim, de clausulado contratual a que se vinculou, de livre vontade, bem como a um conjunto de deveres e obrigações, de cariz militar, que o condicionam, pela natureza das coisas e bem assim, acarretam consequências, em razão da sua livre vontade em querer rescindir o contrato de prestação de serviço militar. 2.º Se tal condicionante de deferimento tem origem, ainda que indiretamente, no pagamento da indemnização a que se refere o artigo 49.º do RLSM, sempre se dirá, que a mesma decorre, diretamente da própria Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 276.º mormente o n.º 6 que prevê que “nenhum cidadão poderá conservar nem obter emprego do Estado ou de outra entidade pública se deixar de cumprir os seus deveres militares ou de serviço cívico quando obrigatório”

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