TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

253 acórdão n.º 76/16 situação particularmente grave». Pelo n.º 2 do artigo 482.º do mesmo diploma, a violação desse dever cons- titui uma contraordenação grave, que é punida nos termos do n.º 2 do artigo 620.º do Código do Trabalho então vigente. A decisão recorrida recusou aplicar ao caso dos autos o referido preceito, por considerar que contém uma descrição “demasiado vaga” da conduta, insuficiente para permitir uma determinação minimamente aceitável de uma infração de mera ordenação social, constituída que é por conceitos indeterminados que não permitem ao empregador saber se deve ou não comunicar o acidente de trabalho. E de facto, se a fórmula «acidentes mortais» constitui um enunciado facilmente determinável em sede interpretativa, já que é possível fixar objetivamente o conceito de «morte» com recurso à experiência comum, o mesmo não ocorre com a expressão «evidenciem uma situação particularmente grave», que é insuscetível como tal de exprimir com suficiente determinação os acidentes de trabalho que devem ser comunicados às autoridades fiscalizadoras das condições de segurança no trabalho. Realmente, a expressão reveste-se de um elevado grau de indeterminação no seu conteúdo normativo. Para além da significação semântica da expres- são, o sentido nela pressuposto não pode ser objetivamente determinável em toda a sua extensão. Sabe-se que nem todos os acidentes de trabalho devem ser comunicados às autoridades, mas de entre aqueles que devem ser comunicados há uma zona de indefinição e de insegurança que, sem um desenvolvimento complementar, não é compatível com o mínimo de determinação exigível ao tipo contraordenacional. Se o recurso à expe- riência comum ou a conhecimentos científicos e técnicos do ramo da medicina permite conhecer os casos que seguramente estão abrangidos ou excluídos do conceito de «acidente particularmente grave», há um número indefinido de situações relativamente às quais pode não haver um entendimento unívoco quanto à valoração da gravidade do acidente para efeitos de comunicação às autoridades do trabalho. Decerto que um acidente que evidencie a perda de um membro importante do corpo, da visão, da audição ou a invalidez é um acidente que objetivamente está incluído naquele conceito; de igual modo, um acidente de que resulte uma ligeira laceração ou dor muscular que não determine a incapacidade para o trabalho é uma hipótese que objetivamente não está coberta pelo mesmo conceito. Mas pode haver alterações na integridade psicofísica do trabalhador que nem o recurso às regras da experiência e da ciência permite determinar com segurança se o acidente deve ou não ser comunicado às autoridades: um acidente de que resulte um entorse ou luxação com incapacidade para o trabalho por oito dias é particularmente grave para justificar aquela comunicação? A resposta só pode ficar à mercê da avaliação subjetiva-individual de cada empregador, pois aí deixa de haver lugar para uma opção objetivamente fundada. De facto, não é a perícia médica, a experiência comum ou as convicções éticas e culturais da comunidade que ditam se aquela lesão é ou não especialmente grave para os efeitos intencionados pelo dever de comunicação. Há aqui um espaço em branco, um vazio normativo, que apenas a subjetividade do empregador poderá preencher.  De modo que através da fórmula «evidenciem uma situação particularmente grave» não é possível deduzir ou determinar todos os acidentes de trabalho que o empregador está obrigado a comunicar à ACT. E a dificuldade em conceitualizar os acidentes de trabalho que devem ser comunicados não foi ultrapassada através da indicação de um critério capaz de assegurar ao empregador a imediata cognoscibilidade daqueles acidentes. O conteúdo significativo daquela expressão legal não é imediatamente compreendido ou facil- mente interpretado no contexto em que é convocado: o sentido intencional do termo «situação» tanto pode ser a lesão sofrida pelo trabalhador como o tipo de evento e o estado de segurança em que ocorreu o acidente; e o conceito «particularmente grave» é demasiado aberto para que possa ser preenchido com um elevado grau de objetividade, sendo certo que o advérbio «particularmente» ainda mais acentua a dificuldade em pré-determinar dentro dos acidentes graves os que são especialmente graves. Para além dos fins que determinaram a imposição do dever de comunicação, a norma não fornece pois um ponto de orientação suficientemente determinado para que o empregador possa conhecer com rigor quais os acidentes de trabalho que está obrigado a comunicar. O artigo 257.º objeto de fiscalização nem sequer vem acompanhado de uma enumeração casuística de exemplos de acidentes particularmente graves, que permita uma objetivação adequada e suficiente do que deve ser comunicado às autoridades, ou de uma

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