TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
237 acórdão n.º 62/16 OEstatuto Disciplinar dosTrabalhadores que ExercemFunções Públicas, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro, bem como o regime disciplinar que lhe sucedeu, inserido na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGT), e se encontra atualmente em vigor, já não contemplam a suspensão de exercício de funções como efeito do despacho de pronúncia, e limitaram-se a determinar a obrigatoriedade de comunica- ção do despacho de pronúncia, por parte do Ministério Público, ao órgão ou serviço em que o trabalhador desempenha funções (artigos 7.º, n.º 1, e 179.º, n.º 1, respetivamente). O que significa que, no regime disciplinar geral atualmente vigente, o despacho de pronúncia proferido em processo penal, na medida em que pressupõe a recolha de indícios suficientes da prática de um crime, de que possa resultar uma probabilidade razoável de que ao arguido venha a ser aplicada uma pena, apenas justi- fica que se dê conhecimento ao dirigente do serviço com competência disciplinar para avaliar a conveniência da instauração de procedimento disciplinar, se os factos tiveram relevância nesse plano, e, eventualmente, se adotarem medidas cautelares, que poderão incluir a suspensão preventiva do exercício de funções do arguido quando a sua presença se revele inconveniente para o serviço (artigo 211.º da LGT). A suspensão do exercício de funções nos termos do artigo 38.º, n.º 1, do Regulamento Disciplinar da PSP tem, no entanto, um diferente alcance, visto que se traduz numa necessária consequência da pronúncia e, por isso, num efeito que a lei faz derivar direta e automaticamente de um ato processual penal, indepen- dentemente de prévia instauração de procedimento disciplinar ou de audiência do arguido ou de qualquer outra ponderação sobre a oportunidade de afastamento do arguido da sua normal atividade profissional. Em todo o caso, cabe fazer notar que a suspensão do exercício de funções, para além de se encontrar dependente da prova indiciária de que o arguido é responsável pelos factos que integram a prática de crime, apenas tem lugar quando a infração é punível com pena de prisão superior a três anos, tornando-se, por isso, exigível um especial índice de gravidade penal, que correspondia também ao preenchimento do requisito necessário para a imposição ao arguido de prisão preventiva ou para a aplicação de pena de prisão efetiva [artigos 202.º, n.º 1, alínea a) , do Código de Processo Penal e 50.º, n.º 1, do Código Penal, na redação ante- rior à reforma de 2007, vigente à data da publicação do Regulamento Disciplinar da PSP]. Por outro lado, importa ter em consideração que, em face do específico estatuto disciplinar dos agentes da PSP, é a prática de certo tipo de crimes, e não de todo e qualquer crime, que conduz à aplicação de uma medida disciplinar expulsiva [artigo 47.º, n.º 2, alíneas b) e g) ], pelo que a suspensão de exercício de funções prevista no falado artigo 38.º do Regulamento Disciplinar da PSP não pode ser vista como uma medida cautelar inerente à possível aplicação de uma pena de demissão ou de aposentação compulsiva que seja ten- dencial ou necessariamente decorrente da imputação dos factos pelos quais o arguido é pronunciado. Não estamos aqui, em todo o caso, perante uma restrição de direitos que implique a antecipação da aplicação de uma pena ou um qualquer juízo ético-jurídico de censura sobre os factos criminalmente puní- veis, assim como não se trata de uma pena acessória ou de um efeito que se encontre associado à condenação penal. A suspensão do exercício de funções decorrente da prolação do despacho de pronúncia constitui antes um efeito de direito que, sendo desencadeado por um mero ato processual penal, se repercute na relação de emprego público e representa, por isso, uma consequência jurídica de natureza estritamente disciplinar. Isso é o que também resulta da inserção sistemática da norma no âmbito das disposições gerais atinen- tes à responsabilidade disciplinar e do facto de o mesmo preceito, concomitantemente, impor às entidades judiciárias o dever de comunicação do despacho de pronúncia ao órgão dirigente da PSP para efeitos dis- ciplinares (n.º 3). E assim se compreende que, nos termos da mesma disposição, a suspensão de efeitos se mantenha até à decisão final absolutória ou até à decisão final condenatória, o que parece significar que, não se verificando a caducidade por efeito de uma sentença que absolva o arguido da prática do crime, a medida extingue-se pela sua substituição, em caso de sentença condenatória, por uma pena acessória de proibição do exercício de função, cuja aplicação depende da valoração feita pelo tribunal de julgamento segundo os cri- térios gerais da determinação da pena, ou pela suspensão do exercício da função durante o cumprimento da
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=