TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

229 acórdão n.º 56/16 Saliente-se, todavia, que não cabe ao Tribunal Constitucional determinar o regime jurídico aplicável na sequência do julgamento de não inconstitucionalidade, seja no sentido da repristinação do regime do artigo 65.º do Regulamento aprovado pelo Decreto n.º 44623 anterior às inovações introduzidas pelo artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, seja em qualquer outro. Trata-se de uma competência exclusiva do tribunal recorrido. 2.2.1. De todo o modo, ainda que o tribunal a quo, aplicando o direito aos factos após o julgamento de inconstitucionalidade resultante do exposto no item 2.1. supra, se veja confrontado com a possibilidade de apli- car unicamente a pena de multa, não estará, nesse caso, comprometida tal possibilidade, face à Constituição. 2.2.2. 1. Antes de mais, há a salientar que – como o Ministério Público refere nas suas alegações – sendo o diploma anterior à Constituição de 1976, não se colocam em relação à norma em causa, proble- mas de inconstitucionalidade orgânica, visto que “a inconstitucionalidade superveniente só opera relativa- mente a inconstitucionalidades materiais, que não a inconstitucionalidades orgânicas ou formais” (Acórdão n.º 279/04, na linha dos Acórdãos n. os 29/83, 313/85, 201/86, 261/86, 468/89, 330/90, 352/92, 597/99, 556/00 e 110/02). 2.2.2. 2. A pena de multa complementar foi alvo de forte crítica pela doutrina pelo seu sinal contrário à função político-criminal da pena de multa alternativa à prisão, cuja aplicação o Código Penal favorece (cfr., por todos, Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português, parte geral II: as consequências jurídicas do crime, Lisboa, 1993, pp. 154 e segs.) e consiste na previsão legal da aplicação de pena de prisão e, simulta- neamente, de uma pena de multa pela prática de um crime. Estabelecendo-se duas consequências para a prática da infração, nada obsta a que, suprimida uma delas, a outra se mantenha. Ao contrário do que se afirma na decisão recorrida, nada impede que se – por algum fundamento válido – o juiz se vir confrontado com a possibilidade de aplicar apenas a pena de multa, por não poder aplicar a pena de prisão que integra a pena mista de prisão e de multa, venha a aplicar apenas a pena de multa. Sobre a matéria existe, aliás, na jurisprudência deste Tribunal, um precedente que aqui assumimos com valor persuasivo. Perante uma pena de prisão e multa (artigo 6.º, n.º 1, conjugado com o n.º 1 do artigo 2.º do Decreto- -Lei n.º 147/79, de 24 de maio, que previa o ilícito que consiste na compra de pescado fresco transacionado, em primeira venda, fora da lota) o Tribunal, no Acórdão n.º 97/88, julgou a norma inconstitucional na parte em que estabelecia a punição com pena de prisão, acrescentando: «[…] Só nessa parte há que julgar a norma inconstitucional. Como pondera o magistrado do Ministério Público, contrariamente ao que se decidiu na sentença recorrida, é de entender que o legislador, entre punir a infração em causa nos autos apenas com multa (em vez de com multa e prisão) e deixá-la impune, como veio a acontecer, preferisse aquela primeira solução. É, pois, de concluir que entre as sanções cominadas para o ilícito que a norma prevê (multa até 10 000$00 e prisão até um mês) não existe uma relação de dependência – ao menos, de uma dependência tal que seja suscetível de impor que, julgada inconstitucional a norma no segmento apontado, deva ela também ser julgada inconstitu- cional, consequencialmente, na parte em que prevê uma pena de multa como punição para o ilícito que tipifica. […]» (sublinhado acrescentado). A este argumento poderíamos acrescentar, complementarmente, ponderando a circunstância do legis- lador ter sempre mantido ativo o seu juízo de censura penal sobre o comportamento aqui em causa, jamais

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=