TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

224 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL «[…] Não é permitido ao pescador utilizar simultaneamente mais do que dois aparelhos (cana ou linha de mão), devendo estes estar sempre ao alcance da sua mão. […]». O artigo 65.º do Regulamento aprovado pelo Decreto n.º 44623, de 10 de outubro de 1962, pune a prática da pesca com inobservância do disposto no artigo 40.º, § 1.º, com a pena de 10 a 30 dias de prisão e multa de 2,99 euros a 74,82 euros. Quanto à pena de prisão, o artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, que apro- vou o Código Penal, previu: «[…] Ficam alterados para os limites mínimo e máximo fixados no artigo 40.º, n.º 1, do Código Penal todas as penas de prisão que tenham duração inferior ou superior aos limites aí estabelecidos. […]». A pena mínima fixada no artigo 40.º, n.º 1, do Código Penal (na aludida redação, correspondendo ao artigo 41.º, n.º 1, na redação atual) é de um mês de prisão. Do exposto resulta que, por força da conjugação das normas citadas, a pena (de prisão) mínima fixada para a infração ao disposto no artigo 40.º, § 1, do Regulamento aprovado pelo Decreto n.º 44623, de 10 de outubro de 1962, passou a coincidir com a pena máxima prevista para o mesmo crime, transformando-se em pena de prisão fixa, tendo passado o aplicador, pois, a não dispor de espaço algum para doseamento da pena. 2.1.1. O Tribunal já teve oportunidade de se pronunciar, por diversas vezes, sobre a inconstituciona- lidade das penas fixas. Assim sucedeu no Acórdão n.º 102/15 (no qual estava em causa, precisamente, a inconstitucionalidade das mesmas normas que constituem objeto do presente recurso): «[…] Logo nas primeiras décadas da sua atividade, o Tribunal desenvolveu o seu entendimento sobre quais seriam os princípios fundantes (e fundantes, porque impostos pela Constituição) do Direito Penal e do Direito Processual Penal. Numa série de decisões que se iniciaram em 1984 e se prolongaram pela década de 90 do século passado o Tribunal foi dizendo que a política criminal de um Estado de direito não poderia deixar de ser uma política assente no princípio da culpa; no princípio da necessidade das penas e das medidas de segurança; no princípio da subsi- diariedade e no princípio da humanidade. Uma síntese de todo este entendimento pode ler-se, por exemplo, no Acórdão n.º 83/95 ( Acórdãos do Tribunal Constitucional, 30.º Vol., 1995, pp. 525 e 528): ‘O direito penal é um direito de proteção. Ele só deve, por isso, intervir para proteger bens jurídicos. E mais: a sua intervenção apenas se justifica se não for possível o recurso a outras medidas de política social, igualmente efica- zes, mas menos «violentas» que as sanções criminais. (.) O direito penal tem, assim, um caráter fragmentário e sub- sidiário, cumprindo uma função de ultima ratio .(.) O legislador, na sua decisão de criminalizar os comportamentos lesivos de bens jurídico-penais, tem ainda que observar outros princípios. Alguns deles, sendo embora princípios meta-jurídicos, acham-se precipitados, desde logo, na ideia de Estado de direito. É o caso do princípio da justiça, que impede que o legislador, quando decide punir uma conduta, atue de forma voluntarista e arbitrária: ele deve sentir-se, antes e sempre, limitado (…) «pelas conceções de justiça que todo o ordenamento jurídico pressupõe». É o caso ainda do princípio da humanidade que reclama que as penas que o legislador cominar (o que só deve fazer se forem necessárias) sejam tão suaves quanto possível. Mas mais: a liberdade de conformação do legislador, na sua decisão de criminalizar comportamentos humanos, acha-se limitado pelo princípio da proporcionalidade (…).’

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