TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

21 acórdão n.º 3/16 16.º Fá-lo, aliás, de forma totalmente desproporcionada, atentando contra o princípio da proteção da confiança em que deve assentar a relação de todos os cidadãos com o Estado e com as instituições que o integram, conjugado com os princípios da proporcionalidade e da igualdade. 17.º Isto mesmo vem sendo sublinhado pelo Tribunal Constitucional em inúmeros arestos, entre outros o Acórdão n.º 232/88. Refere este que esse princípio postula «uma ideia de proteção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na atuação do Estado, o que implica ummínimo de certeza e segurança jurídica nos direitos das pessoas e nas suas expectativas juridicamente criadas e, consequentemente, a confiança dos cidadãos da comunidade na tutela jurídica». 18.º No presente caso e no que ao artigo 80.º do OE2015 diz respeito, é manifesta a ofensa do princí- pio constitucional da tutela da confiança e do princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso, por implicar a supressão integral de um direito conferido: anula-se, de uma só vez, toda a sua ontologia, o que parece assumir um gratuito propósito punitivo dos abrangidos pela norma em questão. 19.º Traduz-se tal num sacrifício intolerável, por excessivo, de um número restrito de destinatários – podendo (e devendo), preferir-se solução que não tenha semelhante alcance e tão duras consequên- cias –, violando-se, também, a esse título, o princípio da igualdade, na medida em que a suspensão agora determinada não se estende a todos os cargos associados à subvenção mensal vitalícia em causa. 20.º Já no Acórdão n.º 353/12 o Tribunal Constitucional chamava à atenção para os efeitos retrospeti- vos (para não dizer retroativos), de medidas similares que, em vez de atingirem futuros beneficiários da subvenção em causa, atingem, antes, aqueles que já a viram atribuída, em conformidade com a lei que a conferiu. 21.º Acresce que o regime definido pelo artigo 80.º da Lei do OE2014 assenta, desde logo, numa opção basilar incompatível com o que decorre do artigo 117.º da Constituição. Com efeito, o estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos integra, além de direitos e poderes funcionais, um amplo feixe de direitos pessoais. Não pode o legislador ordinário criar, como ora fez, um teto de rendimento, cuja violação ou acatamento sejam calculados com base na soma dos rendimentos do eventual agregado familiar. Iguais em direitos no decurso do mandato, os titulares de cargos políti- cos não podem ver essa igualdade quebrada após o exercício de funções, por força da sua situação civil. Acresce que a fixação do montante máximo em causa, nos termos em que é feita, viola o princípio da proibição do arbítrio e da proporcionalidade. 22.º As normas em causa contendem também, pelo que ficou exposto, com os princípios da segurança jurídica e da confiança, tal como fluem do artigo 2.º da CRP e tal como vêm sendo aplicados pela jurisprudência constitucional. Como assinalou o recente Acórdão n.º 413/14, o Tribunal Consti- tucional tem uma jurisprudência constante e reiterada neste sentido (cfr., em especial, a formulação do Acórdão n.º 128/09, reiterada em numerosas decisões posteriores). Assim: «A aplicação do princípio da confiança deve partir de uma definição rigorosa dos requisitos cumulativos a que deve obedecer a situação de confiança, para ser digna de tutela: em primeiro lugar, as expectativas de estabilidade do regime jurídico em causa devem ter sido induzidas ou alimentadas por comportamentos dos poderes públicos; elas devem, igualmente, ser legítimas, ou seja, fundadas em boas razões, a avaliar no quadro axiológico jurídico-constitucional; por fim, o cidadão deve ter orientado a sua vida e feito opções, precisa- mente, com base em expectativas de manutenção do quadro jurídico. Dados por verificados esses requisitos, há que proceder a um balanceamento ou ponderação entre os inte- resses particulares desfavoravelmente afetados pela alteração do quadro normativo que os regula e o interesse público que justifica essa alteração. Com efeito, para que a situação de confiança seja constitucionalmente

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