TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

205 acórdão n.º 55/16 de publicar notícias e de investigar, salvo quando estivessem absolutamente certos da veracidade dos factos, ou pelo menos, restringiria essas liberdades de modo desproporcionado. No fundo, o regime da responsabilidade civil, a título de mera negligência (e, no nosso caso, na forma inconsciente) poderia vir a funcionar como mecanismo de autocensura, em prejuízo da democracia. […]» E, pese embora, neste Acórdão n.º 292/08, se tenha concluído não ser esse o caso dos respetivos autos, o que cumpre reter é que a imposição de uma obrigação de indemnização (ou uma condenação criminal – vide o Acórdão n.º 113/97) pode constituir uma afetação relevante de um direito do qual é titular o sujeito obrigado a indemnizar, situação frequentemente posta em evidência pelo Tribunal Euro- peu dos Direitos do Homem. Como se escreveu no acórdão de 7 de dezembro de 2010, da 2.ª Secção, queixa n.º 39324/07 (disponível na base de dados de jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, em http://hudoc.echr.coe.int/ ), na linha de muitos outros (vide também, na mesma linha, o acórdão de 29 de março de 2011, da 2.ª secção, queixa n.º 1529/08): «[…] No caso, a quantia de € 75 000 à qual todos os requerentes foram condenados – mas que acabou por ser paga na totalidade pelo primeiro requerente – era incontestavelmente de um montante excecionalmente elevado, sobretudo face a outros processos de difamação submetidos a tribunais portugueses de que o Tribunal teve conhe- cimento e se se tiver em conta que se tratava da reputação de uma pessoa coletiva e não de um indivíduo. Uma condenação deste tipo corre inevitavelmente o risco de dissuadir os jornalistas de contribuírem para a discussão pública de questões de interesse para a vida da comunidade. De igual modo, esta condenação é de natureza a impedir a imprensa de cumprir o seu papel de informação e de controlo ( Monnat c. Suíça, n.º 73604/01, § 70, CEDH 2006 X). […]». Da síntese exposta resulta, com interesse para a presente decisão, que o direito a uma indemnização e a obrigação de indemnizar – no que à tutela constitucional dos direitos respeita – não devem ser olhados de forma desligada das respetivas implicações na tutela dos direitos, seja na perspetiva (positiva) da reparação dos danos como forma de tutela, seja na perspetiva (negativa) da limitação ao exercício de direitos através do vínculo das obrigações. Num caso ou noutro, a indemnização nunca releva enquanto tal, mas como expres- são da tutela conferida ou retirada a um direito protegido pela Lei Fundamental. O mesmo é dizer, agora de outro ponto de vista – este no âmago da questão dos autos – que só podemos afirmar que a atribuição do direito a uma indemnização tem implicações na substância de um direito acolhido na Constituição quando a atribuição ou não atribuição dessa indemnização tiver como efeito a afirmação ou a compressão ou elimi- nação desse direito.  O que se disse vale no âmbito da responsabilidade extracontratual; e pode, por evidente identidade de razão, transpor-se para a responsabilidade contratual nos casos – como é o dos presentes autos – em que a violação dos direitos absolutos tem origem no contexto de obrigações negociais incumpridas. Nesse caso, concorrem, como é sabido, ambas as modalidades da responsabilidade, o que tem levado à discussão sobre as possibilidades de opção pelo lesado do regime mais favorável ou de consumpção [cfr. Álvaro Rodrigues, “Reflexões Em Torno da Responsabilidade Civil dos Médicos”, in Direito e justiça, vol. 14, tomo 3 (2000), especialmente pp. 191 e segs.]. De todo o modo, e independentemente da opção a tomar quanto a esta ques- tão (de que a presente decisão não se ocupa) o certo é que o dever de indemnizar continua a ser expressão da tutela dos direitos absolutos que – principal, secundária ou reflexamente – devem ser protegidos ou podem resultar afetados na execução do contrato. E aqui, enfim, não deixamos de observar, enquanto direito colo- cado em causa por uma prestação contratual claramente inadequada por parte dos recorrentes, em última análise, o direito dos recorridos se autodeterminarem nas suas opções reprodutivas, dentro do universo de

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