TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
187 acórdão n.º 55/16 aos recorridos a verdadeira informação sobre o estado do nascituro, tinham colocado ao dispor destes informação preciosa que os iria habilitar a tomar uma decisão ponderada e consciente sobre uma possibilidade que a lei, na altura, lhes concedia, e que era a de optarem pela interrupção voluntária da gravidez. 10. Como bem se diz na decisão recorrida, a falha médica, leia-se dos recorrentes, “residiu na omissão de todos os conhecimentos, diligências e cuidados para dar a conhecer aos autores a condição do filho porque foram mal interpretados os exames e porque não foi comunicado aos pais o seu resultado, incumprindo os réus os deveres de informação, desrespeito pelas leges artis medicinae, acabando por causar um dano aos autores, uma vez que a sua adesão ao prosseguimento da gravidez não foi consequente a um consentimento esclarecido, dotado de todas as informações relevantes.’ 11. Depois, e esclarecendo a confusão dos recorrentes acerca da compatibilidade da legislação sobre a IVG com o artigo 24.º da CRP, a decisão recorrida esclarece que a conclusão citada no ponto anterior ‘…não é sequer abalada pelo facto de a comunicação da informação omitida não conduzir à cura do nascituro, mas, apenas, á possibilidade do seu não nascimento, e isto porque, a partir do momento em que a lei consagra, dentro de certos condicionalismos, a interrupção voluntária da gravidez de um feto com anomalias graves, está a admitir que uma vida, nestas condições, pressupõe um dano, o qual não reside na vida em si, mas nas anomalias de que a mesma pode ser portadora’. 12. As dúvidas dos recorrentes sobre a verificação dos pressupostos da responsabilidade civil contratual nas suas condutas são desfeitas na fundamentação da decisão recorrida, quando ali se refere que ‘ficou provado, neste par- ticular, que as deformidades descritas no ponto 4, ou seja, a deficiência transversa do punho, mão e pé esquerdo, a deficiência longitudinal do pé direito e a sindactilia da mão direita, eram detetáveis numa ecografia realizada às 12 semanas de gestação, sendo certo, não obstante, que, em nenhum dos relatórios das ecografias realizadas, designa- damente, no relatório respeitante à ecografia realizada às vinte e uma semanas e um dia de gestação, vem referido que foram visualizados os dedos de qualquer dos quatro membros, antes sempre tendo sido dito pelos réus que realizaram as ecografias que o feto era perfeito e que o bebé estava com excelente saúde…’ e ainda: ‘Deste modo, pelo menos, na ecografia efetuada à vinte e uma semanas e um dia de gestação, eram detetáveis as malformações evidenciadas que o síndroma das bandas amnióticas que se formam na gestação e que as provocaram, por, também, não haverem sido visionadas, não obstaram à sua perceção.’…’ e ainda, citando o anterior Acórdão recorrido: ‘… pelo que, temos de concluir que pelo menos na realização da ecografia realizada às 21 semanas, a médica que a realizou não atuou segundo as regras da boa prática profissional, pois a s deformações do feto já eram detetáveis e não o foram’. 13. Mais adiante, e continuando a desmontar a tese dos recorrentes, a fundamentação do Acórdão recorrido considera a atuação dos recorrentes como contrária às boas regras profissionais como suscetível de legitimar uma imputação ao médico, a título de culpa, de um erro de diagnóstico, dizendo-se que ‘o dever de informação sobre o prognóstico, diagnóstico e riscos envolventes faz parte dos denominados deveres laterais do contrato médico, e o não cumprimento pelo médico dos deveres de cuidado e proteção a que está obrigado pode ser causa de respon- sabilidade contratual.’ 14. Depois, a propósito da questão do nexo de causalidade, a decisão recorrida fundamente a sua existência, sustentando que ainda que a malformação não tenha sido causada pelo médico, ‘o certo que a sua atividade, quando desenvolvida segundo as leges artis, poderia ter evitado o nascimento com aquela deficiência congénita, o que permite consubstanciar um nexo de causalidade suficiente, um nexo de causalidade, ainda que indireto, entre a vida portadora de deficiência e a correspondente omissão de informação do médico por essa situação, ainda que outros fatores tenham para ela concorrido, isto é, quando o facto não produz, ele mesmo, o dano, mas desencadeia ou proporciona um outro que leva à verificação deste’. 15. Ou ainda quando se diz: ‘O nexo de causalidade entre a ausência de comunicação do resultado de um exame, o que configura erro de diagnóstico, e a deficiência verificada na criança, que poderia ter culminado com a faculdade de os pais interromperem a gravidez e obstar ao nascimento, constitui, in casu , o pressuposto determi- nante da responsabilidade civil médica em apreço’.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=