TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

186 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 34.º – Pelo contrário, não só tal leitura ignora o sentido do direito à vida consagrado no artigo 24.º n.º 1, como o propósito disposto no artigo 67.º, n.º 2, alínea d) , surgiu, historicamente, como uma solução que pretendia favorecer a adoção de meios e métodos que evitassem práticas abortivas. 35.º – Deverá ser declarada a inconstitucionalidade dos artigos 483.º, 798.º e 799.º do Código Civil inter- pretados no sentido de constituírem dano indemnizável, nos termos gerais da responsabilidade civil, a vida com deficiência (ou sem ela) e a ausência da possibilidade de escolha pela interrupção voluntária da gravidez, por violação do direito à informação relativa a exame médico, que permitiria uma decisão dos progenitores no sen- tido do prosseguimento ou não da gravidez, por violação do disposto no artigo 67.º, n.º 2, alínea d) , da CRP, na medida que esta norma exclua a possibilidade de recurso à interrupção voluntária da gravidez como instrumento de planeamento familiar, e no artigo 24.º, n.º 1 da CRP, na medida em que aquela interpretação considera a vida em si como um dano e traduz relevância positiva à morte, enquanto expressão do cenário hipotético tradutor da medida do dano, dimensões normativas tidas por contrarias ao âmbito de proteção da vida exigido por este preceito constitucional. […] Deve o presente recurso ser julgado procedente, e ser declarada a inconstitucionalidade dos artigos 483.º, 798.º e 799.º do Código Civil quando interpretados no sentido supra explanado, e ser a decisão do Tribunal a quo revogada absolvendo assim os recorrentes. […]». 1.7.2. 1. Responderam às alegações os recorridos, contrapondo conclusivamente o seguinte: «[…] Conclusões: 1. A questão central a decidir nestes autos é a de saber se a atuação dos recorrentes contém em si os pressupostos legalmente indicados para que aqueles incorram em responsabilidade contratual para com os recorridos, e possam ser condenados numa indemnização reparatória dos danos que causaram. 2. Dizer, em jeito de pergunta, como fazem os recorrentes, se pode este tribunal permitir que alguém tire partido de um prejuízo pelo facto de alguém ter nascido, além de evidenciar que o Acórdão recorrido não foi entendido, constitui ainda uma tentativa de desvirtuar a realidade e descentrar a questão fundamental dos autos. 3. Os recorrentes não entenderam a doutrina das wrongful birth actions , da forma que a decisão recorrida a tratou, e confundem grosseiramente qual o dano que o seu incumprimento contratual veio a gerar. 4. De forma que não se aceita, nem se compreende, os recorrentes, convocando para a questão a legislação que permite a interrupção voluntária da gravidez, e descontextualizando por completo a possibilidade dessa interrup- ção ocorrer até às dez semanas, a qual tem pressupostos totalmente diversos da interrupção que era permitida aos recorrentes no caso concreto, acabam por produzir uma inaceitável conclusão, segundo a qual, a tese da decisão recorrida significaria que toda a vida é tida como um prejuízo que tem de ser ressarcido. 5. Os recorrentes não entenderam ainda que o dano de que fala a doutrina das wrongful birth actions não é a vida, mas sim as deficiências com que essa vida se gerou e que a acompanharam. 6. A interpretação que a decisão recorrida faz dos artigos 483.º, 789.º e 799.º do CC nunca poderia ser con- trária ao disposto no artigo 24.º da CRP, uma vez que subjacente àquela decisão está a interpretação da legislação sobre a IVG que permite que a mesma se faça em caso de doença grave ou malformação do feto. 7. A alusão à IVG até às dez semanas nada tem a ver com o caso dos autos, e sua invocação pelos recorrentes só pode resultar de uma enorme confusão sobre esta matéria, ou de uma desesperada tentativa de se inventar um argumento que veio a possibilitar uma pouco convincente alegação de uma indecifrável inconstitucionalidade. 8. Os recorrentes também ainda não entenderam de que forma a omissão da informação correta sobre o estado do nascituro, que eles culposamente cometeram, é suscetível de ter provocado danos aos requeridos. 9. Ainda que a divulgação da informação omitida não tivesse qualquer resultado positivo no estado de saúde do nascituro, pois isso não iria afastar as malformações, os recorrentes não entenderam ainda que se tivessem fornecido

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