TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

184 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL culminado com a faculdade de os pais interromperem a gravidez e obstar ao nascimento, constitui o pressuposto determinante da responsabilidade civil medica nos presentes autos. 3.º – E consequentemente atribui aos recorridos uma indemnização, pelo facto de não poderem decidir pelo aborto, isto é, pelo facto de não poderem impedir uma vida. 4.º – Esta interpretação viola os preceitos constitucionais previstos no n.º 1 dos artigos 24.º e 67.º, n.º 2, alínea d) da Constituição da República Portuguesa. 5.º – Por este prisma a vida é encarada como um dano, como um prejuízo que se pode liquidar a um terceiro. 6.º – Nos termos do preceituado no artigo 562.º do C.C., quando alguém alega um dano com fim de obter indemnização, faz-se sempre valer da situação que existiria se não tivesse ocorrido o facto causador do dano, ou seja, senão fosse necessária a reparação, que seria assim aborto e, consequentemente, a morte. 7.º – A procedência das chamadas ‘ wrongful birth actions ’ e a necessária interpretação das normas supra citadas, constituem uma violação clara do preceito constitucional que protege toda a vida humana. 8.º – O Douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, que concedeu a indemnização nesses termos, tendo por base a doutrina que concede provimento às ‘ wrongful birth actions ’, parece querer afastar a inconstitucionali- dade da posição afirmando que “a partir do momento em que a lei consagra, dentro de certos condicionalismos, a interrupção voluntária da gravidez de um feto com anomalias graves, está a admitir que uma vida, nestas condi- ções, pressupõe um dano, o qual não reside na vida em si, mas nas anomalias que a mesma pode ser portadora.” (cfr. p. 33 do Douto Acórdão recorrido). 9.º – E consequentemente não é a vida considerada um dano, mas antes a vida com deficiência. 10.º – É certo que a alínea c) do artigo 142.º do C. Penal, não pune a interrupção voluntária da gravidez de um nascituro que pode vir a sofrer de grave doença ou mal formação congénita. 11.º – No entanto, a alínea e) do supra citado artigo do Código Penal, prevê também que não é punível inter- rupção voluntária da gravidez, se for realizada nas primeiras 10 semanas de gravidez. 12.º – Assim a valer a linha orientadora que o Douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça traçou, é pos- sível atribuir uma indemnização, pelo facto de não se poder decidir pelo aborto, independentemente do nascituro sofrer ou não de deformações. 13.º – Nesta interpretação toda a vida é tida como um prejuízo que tem de ser ressarcido. 14.º – É óbvio que esta decisão tem que necessariamente ser declarada inconstitucional. 15.º – O Acórdão 75/10 proferido por este Douto Tribunal Constitucional que apreciou a constitucionalidade da Lei 16/2007 de 17 de abril, que introduziu a não punibilidade da interrupção voluntária da gravidez, se for realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas de gravidez, certamente que não pretendeu dar o alcance que a doutrina que suporta as ‘ wrongful birth actions ’ pretende dar. 16.º – Este Douto Tribunal Constitucional, não considerou o mencionado preceito inconstitucional, pois em ultima analise, era uma medida que protegia a vida humana. 17.º – A interpretação do Supremo Tribunal de Justiça dos artigos 483.º, 798.º e 799.º do CCl, no sentido de constituírem dano indemnizável, a vida (com ou sem deficiência) e a ausência da possibilidade de escolha pela interrupção voluntária da gravidez, por violação do direito à informação relativa a exame médico, é uma interpre- tação que atenta a vida humana. 18.º – A interpretação das citadas normas conforme o explanado no Douto Acórdão recorrido viola claramente o princípio constitucional consagrado no artigo 24.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa. 19.º – Desta forma, apesar da despenalização da interrupção voluntária da gravidez nos casos e dentro dos pra- zos expressamente previstos, não deve ser descuidada a intenção do legislador constitucional ao pretender garantir uma adequada proteção da vida. 20.º – A CRP afirma que ‘a vida humana é inviolável’ sem fazer menção ao estádio de desenvolvimento em que essa mesma vida se encontra e, naturalmente, sem exigir a personalidade jurídica dos respetivos sujeitos ativos. 21.º – Conforme o consagrado no artigo 24.º da CRP, a Constituição Portuguesa não se limita, ao contrário de outros textos fundamentais e da própria DUDH, a dizer que ‘todos os homens têm direito à vida”, afirmando antes, numa fórmula normativa muito mais forte e expressiva, que ‘a vida humana é inviolável’.

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