TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

181 acórdão n.º 55/16 totalmente, dependente de uma terceira pessoa, para o resto da sua vida, necessitando de substituir, anualmente, as próteses aplicadas. Nas « wrongful birth actions », são ressarcíveis os danos não patrimoniais e patrimoniais, onde se não incluem todos os custos derivados da educação e sustento de uma criança, mas, tão-só, os relacionados com a sua deficiên- cia, estabelecendo-se uma relação comparativa entre os custos de criar uma criança, nestas condições, e as despesas com uma criança normal, pois que os pais aceitaram, voluntariamente, a gravidez, conformando-se com os encar- gos do primeiro tipo, que derivam do preceituado pelo artigo 1878.º, n.º 1, do CC. Efetivamente, o que está em causa não é a possibilidade de a pessoa se decidir, mas antes de se decidir num sentido ou noutro, de escolher entre abortar ou prosseguir com a gravidez, a partir do momento em que a lei penal autoriza os pais a interromper a gravidez, ante a previsão segura de que o feto irá nascer com malformação congé- nita incurável, atento o disposto pelo artigo 142.º, n.º 1, c) , do Código Penal. […] [S]e o Direito, enquanto ordem normativa reguladora de interesses sociais conflituantes, não deve servir como escudo de valores religiosos, morais, filosóficos, éticos ou de costumes, não podem os autores, que afirmaram esse propósito na petição inicial, ver denegado o proclamado exercício da faculdade da interrupção voluntária da gravi- dez, a pretexto de que ‘a aceitação da responsabilidade do médico por uma qualquer deficiência, significa eviden- temente que essa responsabilidade não pode ignorar e absorver a relevância da conduta dos pais na origem da vida do filho, como acontece quando um filho é concebido com uma malformação congénita e essa malformação não foi depois corrigida ou atenuada por um lapso médico, em que a responsabilidade (médica) pela deficiência nunca pode ser equiparada à responsabilidade (dos pais) pela vida, devendo a indemnização ser sempre proporcionada ao papel efetivo do médico na produção do resultado danoso’. […]» (sublinhados acrescentados). 1.6.1. Confrontados com esta decisão condenatória, suscitaram as rés a nulidade do correspondente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça. Em suma, insistiram na ideia de que as malformações não foram provocadas pela ausência de comunicação do (resultado do) exame. Por outro lado, a faculdade de os pais interromperem a gravidez resultaria de um facto – “[a] não deteção atempada das deformidades descritas em “D)” impediu que os Autores pudessem efetuar uma interrupção médica da gravidez?” – considerado não provado. Logo, na prática, o Supremo Tribunal de Justiça alterou a resposta ao quesito para provado, sob pena de não poder usar tal facto, como fez, ao caracterizá-lo em termos de nexo de causalidade. Ao desconsi- derar a matéria de facto provada e decidir contra ela, o Supremo Tribunal de Justiça teria violado o disposto nos artigos 202.º, n.º 2, e 204.º da Constituição da República Portuguesa (CRP). 1.6.2. O Supremo Tribunal de Justiça indeferiu a arguição de nulidade, afirmando que o facto foi dado como não provado e nesses precisos termos considerado na decisão, sendo que isso – a não prova – não sig- nifica que se tenha provado o seu contrário, limitando-se o tribunal a aplicar o direito à factualidade dada como provada, sem conceder relevância positiva aos factos não provados. 1.7. Notificados deste último acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, interpuseram as rés H., Lda. e D. recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos seguintes: «[…] [N]ão se conformando do Douto Acórdão que concedeu revista aos autores/recorrentes, revogando o Douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação e repristinou a Douta Sentença proferida em 1.ª Instancia e com o Douto Acórdão da Conferência que o confirmou, vem deles, nos termos dos artigos 69.º, 70.º n.º 1 alínea b) e 2.º, 71.º, n.º 1, 72.º, n.º 1, alínea b) e 2, 75.º n. os 1 e 2, 75.º-A, n. os 1 e 2.º e 78.º, n.º 4, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, interpor recurso para o Tribunal Constitucional, o que faz nos seguintes termos:

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