TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
178 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL de um vínculo jurídico entre a vítima e o lesante decorrente da celebração de um contrato de prestação de serviços médicos, a que se reporta o artigo 1154.º, do Código Civil. Estipula, por outro lado, o artigo 486.º, do CC, que ‘as simples omissões dão lugar à obrigação de reparar os danos, quando, independentemente dos outros requisitos legais, havia, por força da lei ou do negócio jurídico, o dever de praticar o ato omitido’. Por ato médico, entende-se a atividade executada por um profissional de saúde que consiste na avaliação diag- nóstica, prognóstica ou de prescrição e execução de medidas terapêuticas adequadas, relativas à saúde das pessoas, grupos ou comunidades. Aliás, facilmente, se intui que a presente « wrongful birth action » se submete ao regime jurídico da responsabili- dade civil contratual, porquanto decorre de um contrato celebrado entre o médico e o paciente […]. O ónus da prova da culpa depende do tipo de responsabilidade subjacente, isto é, da respetiva natureza con- tratual ou extracontratual. Ora, na responsabilidade contratual, a culpa só se presume se a obrigação assumida for de resultado, bastando, então, a demonstração do inadimplemento da obrigação, ou seja, que o resultado, contratualmente, assumido não se verificou, pelo que, face à culpa, assim, presumida, cabe ao devedor provar a existência de fatores excludentes da responsabilidade. Por seu turno, se a obrigação assumida consistir numa obrigação de meios, no âmbito da responsabilidade civil contratual por factos ilícitos, incumbe ao devedor fazer a prova que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua, ilidindo a presunção de culpa que sobre si recai, nos termos do preceituado pelo artigo 799.º, n.º 1, do CC. Assim sendo, enquanto na responsabilidade contratual pelo não cumprimento de obrigações de resultado, o artigo 799.º, do CC, combina-se com um critério de tipicidade/ilicitude, referido ao resultado, e, deste modo, exo- nera o credor do ónus de provar a omissão do cuidado, exterior ou interior, na responsabilidade contratual pelo não cumprimento de obrigações de meios, o aludido normativo legal já se combina com um critério de tipicidade/ili- citude, referido à conduta, razão pela qual não exonera o credor do ónus de demonstrar a omissão da mais elevada medida de cuidado exterior, sem embargo de a presunção de culpa do devedor, a que alude o n.º 1 do supracitado normativo legal, ser de aplicar à responsabilidade contratual pelo não cumprimento da obrigação de meios, quer à obrigação contratual do médico como obrigação de resultado. […] V. 4. Os autores sustentam o pedido de indemnização pelos danos sofridos, em resultado do deficiente e erró- neo cumprimento do dever de informação, […] relativamente à gravidez da autora, que não fizeram reportar, nos relatórios dos exames de ecografia obstétrica, as gravíssimas malformações dos membros superiores e inferiores do feto, que viriam a determinar uma incapacidade permanente global de 95% do menor, sendo certo que essas deformações eram detetáveis às 12 semanas, o que não aconteceu, por descuido e negligência grosseira, imputável às mesmas, e que impediu que os autores pudessem efetuar uma interrupção médica da gravidez. […] A maioria dos contratos de prestação de serviços médicos veicula, assim, uma obrigação de meios, pois que o médico não promete a cura, mas sim o empenho, a técnica e o cuidado para atingir um determinado efeito, não implicando, portanto, a não consecução dessa finalidade a inadimplência contratual, e, por isso, quando esse objetivo não tenha sido atingido, cabe, então, ao doente provar que tal facto decorreu de um comportamento negligente do médico. Ora, constituindo exceção, na área das Ciências Médicas, as obrigações de resultado, a não obtenção de um resultado específico determina, por si só, nessas situações, a presunção de um inadimplemento contratual culposo, por parte do devedor da prestação [médico], competindo, então, a este provar que a impossibilidade de cumpri- mento, isto é, de obtenção daquele resultado devido é imputável a caso fortuito ou de força maior. Ora, a realização de exames laboratoriais, com o consequente diagnóstico, constitui uma obrigação de resul- tado, tratando-se mesmo de um exemplo clássico de uma típica obrigação médica de resultado, porquanto, aten- dendo ao elevado grau de especialização alcançado pelos exames laboratoriais, em que a margem de incerteza e
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