TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

177 acórdão n.º 55/16 1.6. Apreciando a revista interposta pelos autores, proferiu o Supremo Tribunal de Justiça o acórdão de 12 de março de 2015 (fls. 759/807) – trata-se da decisão objeto do presente recurso –, concedendo a revista, revogando, pois, o acórdão da Relação de Guimarães e repristinando a Sentença de primeira instância. Aqui transcrevemos algumas passagens desse acórdão do Supremo Tribunal: «[…] [O] aludido quesito novo, ou seja, ‘[a] não deteção atempada das deformidades descritas em D) impediu que os autores pudessem efetuar uma interrupção médica da gravidez?’, tendo sido redigido, sob uma formulação nega- tiva, isto é, ‘a não deteção’ e ‘impediu’ ou ‘não permitiu’, que conheceu a resposta de ‘não provado’, pela Relação, ao contrário do que acontecera em sede de 1.ª instância, que o considerou como ‘provado’, determina que essa factualidade se deva considerar como não alegada. Deste modo, a falta de prova desse facto negativo significa, apenas, que ele pode ter tido lugar ou não, mas não constitui prova de que ele não teve lugar. […] V. Do nexo de causalidade entre o dano e a falta atempada de informação V. 1. […] A este propósito, o acórdão recorrido, afirmando ‘demonstrada a execução defeituosa ou ilicitude da conduta e a culpa’, entende que se não verifica ‘o nexo de causalidade entre o sofrimento dos pais e a atuação dos recorrentes’, porquanto ‘o nexo de causalidade, no caso vertente, estabelecer-se-ia entre o comportamento da ré DD (não infor- mação aos Autores das malformações do feto) e o forte abalo sentido pelos autores a quem, durante a gravidez, sem- pre foi dito que o feto era perfeito e que o bebé estava com excelente saúde e que vieram posteriormente a verificar, aquando do nascimento do filho que não era assim, acontece, porém, que o dano decorrente do desconhecimento atempado das ditas deformidades não foi causado pela falta de informação acerca da existência daquelas, mas pelo dano em si, ou seja, por terem um filho com malformações ou deformações’. V. 2. As « wrongful birth actions » surgem quando uma criança nasce malformada e os pais, em seu próprio nome, pretendem reagir contra o médico e/ou as instituições hospitalares ou afins, pelo facto de os terem privado de um consentimento informado que, eventualmente, poderia ter levado à interrupção da gravidez. Trata-se de um cenário que ocorre ou porque o médico não efetuou os exames pertinentes, ou porque os inter- pretou, erroneamente, ou porque não comunicou os resultados obtidos, não se mostrando, porém, responsável pela verificação da deficiência, propriamente dita, que surge, normalmente, desde o início da vida pré-natal. Contudo, a omissão do esclarecimento sobre essa deficiência é considerada ilícita, enquanto que o comporta- mento alternativo lícito do médico teria evitado, na perspetiva dos autores, o nascimento e, deste modo, a vida, gravemente, deficiente, porquanto os mesmos alegam que se tivessem sido informados das malformações que o embrião/feto desenvolveu durante a gestação, teriam optado por interromper a gravidez, imputando, assim, aos réus um erro no diagnóstico pré-natal. Com efeito, os chamados diagnósticos pré-natais são exames que se destinam a detetar anomalias fetais, durante a gestação, assumindo várias finalidades, nomeadamente, a de tranquilizar ou preparar os progenitores acerca da saúde do feto, permitir, quando possível, o tratamento do feto, indicar o modo mais adequado para a realização do parto, determinar o tratamento a ser dirigido ao recém-nascido e, nos países onde o aborto é permitido, o diagnós- tico de uma deficiência fetal incurável possibilita ainda o exercício do direito à interrupção voluntária da gravidez. Deste modo, o erro médico consistente na falta de deteção de uma anomalia embrionária ou fetal ou na ausên- cia de informação acerca de tal quadro de deficiência, pode ocasionar a perda de chance de uma escolha reprodu- tiva, mais, especificamente, a realização ou não de um aborto, pelo que este específico direito à autodeterminação é o campo por excelência das ações de « wrongful birth » e de « wrongful live », cada vez mais comuns nos países onde a interrupção voluntária da gravidez é permitida. V. 3. Invocando os autores o exercício de medicina privada, por parte das rés Dr.ª D. e H., Lda. […] trata-se […] de uma responsabilidade de natureza contratual, em que a obrigação de indemnizar tem por fonte a existência

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