TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

172 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL artigo 67.º, n.º 2, alínea d) , surgiu, historicamente, como uma solução que pretendia favorecer a adoção de meios e métodos que evitassem práticas abortivas’ [Parecer do Conselho Consultivo da PGR, n.º 31/82]. […] Ora, na presente demanda foi estabelecida uma indemnização com base num facto totalmente indeterminável e casuístico, ou seja, se teria abortado caso soubesse das malformações congénitas. Por este prisma a vida é encarada, desde logo, como um dano […]. Portanto, a conduta do médico, apenas seria suficiente para fundar uma pretensão indemnizatória nalguma medida em que a sua conduta implicasse causalmente na produção de um dano, por outras palavras, quando a sua conduta merecesse a desaprovação do Direito. […] Além do mais, não deverá ser aceite a pretensão indemnizatória dos pais tendo por base o dano do nascimento do filho, pois, os encargos económicos alegados têm por base o próprio nascimento. Assim sendo, há uma nítida contradição, pois, a deficiência originária é a própria vida que é tida como um dano, logo, os autores não podem encarar a vida como um prejuízo que possam liquidar a terceiro. Nos termos do preceituado no artigo 562.º do C.C., quando alguém alega um dano com fim de obter indem- nização, faz-se sempre valer da situação que existiria se não tivesse ocorrido o facto causador do dano, ou seja, senão fosse necessária a reparação. Desta sorte, seria o aborto e, consequentemente, a morte. Logo, verifica-se uma contraditio absoluta entre o fundamento da pretensão dos autores e o próprio sentido da pretensão a uma indemnização. […]» (sublinhado acrescentado). 1.4. Pelo Tribunal da Relação de Guimarães foi proferida decisão conhecendo do objeto do recurso (acórdão de 3 de julho de 2014 constante de fls. 569/587). Ali se decidiu, quanto à matéria de facto, alterar a resposta de “provado” para “não provado” ao quesito aditado pelo anterior acórdão dessa mesma Relação (perguntava este: “[a] não deteção atempada das deformidades descritas em “D)” impediu que os Autores pudessem efetuar uma interrupção médica da gravidez?”). No mais, o Tribunal da Relação considerou que o dano decorrente do desconhecimento atempado das deformidades do filho não foi causado pela falta de informação precoce sobre a existência destas, mas pela existência, em si mesmas, das deformidades (cfr. parágrafo final de fls. 584). Assim, concluiu a Relação de Guimarães inexistir nexo de causalidade entre o sofrimento dos pais e a atuação das recorrentes. Negou, pois, a indemnização dos danos patrimoniais, já que a deformidade não resultou de nenhum ato médico. Por outro lado, afirmou-se neste acórdão que o dano moral dos pais não seria maior ou menor em função do conhecimento, mais cedo, das deformidades do filho. Entendeu-se, ainda, não existir direito à indemnização por supressão da escolha de interromper a gra- videz. No essencial, remeteu-se para o Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República n.º 31/82, com o seguinte teor (parcial): «[…] [O] texto constitucional [artigo 67.º/2/ d) da CRP] não autoriza uma interpretação no sentido de que a inter- rupção da gravidez constitui um instrumento de planeamento familiar ou uma solução imposta pela necessidade de garantir o exercício de uma maternidade e paternidade conscientes. Pelo contrário, não só tal leitura ignora o sentido do direito à vida consagrado no artigo 24.º, n.º 1, como o propósito disposto no artigo 67.º, n.º 2, alínea d) surgiu, historicamente, como uma solução que pretendia favorecer a adoção de meios e métodos que evitassem práticas abortivas. […]».

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