TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
149 acórdão n.º 41/16 40.º Ou, finalmente, a posição do Prof. Germano Marques da Silva (cfr. supra n.º 31 das presentes alegações): “Por sua vez, Germano Marques da Silva (Curso de Processo Penal, 4.ª edição, Lisboa 2000, p. 54) salienta que o princípio do juiz natural ou legal “tem por finalidade evitar a designação arbitrária de um juiz ou tribunal para resolver um caso determi- nado. As normas, tanto orgânicas como processuais, têm de conter regras que permitam determinar o tribunal que háde intervir em cada caso em atenção a critérios objetivos; não é, pois, admissível que a norma autorize a determinação discricionária do tribunal ou tribunais que hão-de intervir no processo.” A exigência de anterioridade da lei não poderia, porém, razoavelmente, colocar entraves a qualquer reforma da organização judiciária, pelo que, “em ordem a assegurar a imparcialidade dos juízes e tribunais, excluindo ad hoc , ad casum e suspectus ”, o que importa não seria a competência individualizada de determinado tribunal, mas “apenas que em razão daquela causa ou de categorias de causas a que ela pertence sejam criados post factum tribunais de exceção, ou a definição individual da competência, ou do desaforamento discricionário de uma certa causa, ou por qualquer outra forma discricionária que ponha em perigo o direito dos cidadãos a uma justiça penal independente e imparcial”. ( ob. cit. , p. 58)” 41.º Em suma, a solução interpretativa encontrada, quer pelo digno magistrado judicial do TCIC, quer pelo Acór- dão recorrido, do Tribunal da Relação de Lisboa, de 9 de setembro de 2014, adequa-se, inteiramente, com a tese defendida no Acórdão 614/13, deste Tribunal Constitucional, relativamente ao princípio do juiz natural, segundo a qual (cfr. supra n.º 32 das presentes alegações): “11. O princípio do “juiz natural”, ou do “juiz legal”, para além da sua ligação ao princípio da legalidade em matéria penal, encontra ainda o seu fundamento na garantia dos direitos das pessoas perante a justiça penal e no princípio do Estado de direito no domínio da administração da justiça. É, assim, uma garantia da inde- pendência e da imparcialidade dos tribunais (artigo 203.º da Constituição). Designadamente, a exigência de determinabilidade do tribunal a partir de regras legais (juiz legal, juiz predeterminado por lei, gesetzlicher Richter ) visa evitar a intervenção de terceiros, não legitimados para tal, na administração da justiça, através da escolha individual, ou para um certo caso, do tribunal ou do(s) juízes chamados a dizer o Direito. Isto, quer tais influências provenham do poder executivo – em nome da raison d’État – quer provenham de outras pessoas (incluindo de dentro da organização judiciária). Tal exigência é vista como condição para a criação e manutenção da confiança da comunidade na administração dessa justiça, “em nome do povo” (artigo 202.º, n.º 1, da Constituição), sendo certo que esta confiança não poderia deixar de ser abalada se o cidadão que recorre à justiça não pudesse ter a certeza de não ser confrontado com um tribunal designado em função das partes ou do caso concreto. A garantia do “juiz natural” tem, assim, um âmbito de proteção que é, em larga medida, configurado ou conformado normativamente – isto é, pelas regras de determinação do juiz “natural”, ou “legal” (assim G. Britz, ob. cit, p. 574, Bodo Pieroth/Bernhard Schlink, Grundrechte II, 14.ª edição, Heidelberg, 1998, p. 269). E, independentemente da distinção no princípio do juiz legal de um verdadeiro direito fundamental sub- jetivo de dimensões objetivas de garantia, pode reconhecer-se nesse princípio, desde logo, uma dimensão positiva, consistente no dever de criação de regras, suficientemente determinadas, que permitam a definição do tribunal competente segundo características gerais e abstratas. Logo pela própria ratio do princípio, tais regras não podem, assim, limitar-se à determinação do órgão judiciário competente, mas estendem-se igualmente à definição, seja da formação judiciária interveniente (sec- ção, juízo, etc.), seja dos concretos juízes que a compõem. E isto, quer na 1.ª instância, quer nos tribunais superiores, e quer para o julgamento do processo penal, quer para a fase de instrução (referindo que o princípio
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