TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
147 acórdão n.º 41/16 É um princípio que […] esgota o seu conteúdo de sentido material na proibição da criação ad hoc , ou da determinação arbitrária ou discricionária ex post facto , de um juízo competente para a apreciação de uma certa causa penal. Do que se trata sobretudo é de impedir que motivações de ordem política ou análoga – aquilo, em suma, que compreensivelmente se pode designar por raison d’État – conduzam a um tratamento jurisdicional discri- minatório e, por isso mesmo, incompatível com o princípio do Estado de direito. (…) O princípio do juiz natural tem, assim, a ver com a independência dos tribunais perante o poder político. O que ele proíbe é a criação (ou a determinação) de uma competência «ad hoc» (de exceção) de um certo tri- bunal para uma certa causa. O princípio proíbe, em suma, os tribunais ad hoc . Dizendo com Figueiredo Dias (revista citada): «O princípio do juiz legal não obsta a que uma causa penal venha a ser apreciada por tribunal diferente do que para ela era competente ao tempo da prática do facto que constitui o objeto do processo, só obsta a tal quando, mas também sempre que, a atribuição de competência seja feita através da criação de um juízo ad hoc (isto é: de exceção), ou da definição individual (e portanto arbitrária) da competência, ou do desaforamento concreto (e portanto discricionário) de uma certa causa penal, ou por qualquer outra forma discriminatória que lese ou ponha em perigo o direito dos cidadãos a uma justiça penal independente e imparcial»”. 36.º Ora, nos presentes autos, não estamos perante nenhuma situação de «criação ad hoc , ou da determinação arbi- trária ou discricionária ex post facto , de um juízo competente para a apreciação de uma certa causa penal». E, muito menos, perante «motivações de ordem política ou análoga – aquilo, em suma, que compreensivel- mente se pode designar por raison d’État – [que] conduzam a um tratamento jurisdicional discriminatório e, por isso mesmo, incompatível com o princípio do Estado de direito.» Na realidade, não está em causa, nos presentes autos, «a independência dos tribunais perante o poder político», ou «a criação (ou a determinação) de uma competência « ad hoc » (de exceção) de um certo tribunal para uma certa causa». Mantendo-se inteiramente válida a ideia do Prof. Figueiredo Dias, segundo a qual: «O princípio do juiz legal não obsta a que uma causa penal venha a ser apreciada por tribunal diferente do que para ela era competente ao tempo da prática do facto que constitui o objeto do processo, só obsta a tal quando, mas também sempre que, a atribuição de competência seja feita através da criação de um juízo ad hoc (isto é: de exceção), ou da definição individual (e portanto arbitrária) da competência, ou do desaforamento concreto (e portanto discricionário) de uma certa causa penal, ou por qualquer outra forma discriminatória que lese ou ponha em perigo o direito dos cidadãos a uma justiça penal independente e imparcial»”. 37.º Não há, ainda, lugar a nenhuma violação das dimensões concretizadoras do princípio do juiz natural, a que aludem os Profs. Gomes Canotilho e Vital Moreira (cfr. supra n.º 30 das presentes alegações): «a ‘exigência de determinabilidade’ (prévia individualização por lei geral do juiz competente), o ‘princípio da fixação da competên- cia’ (observância das competências decisórias legalmente atribuídas a esse juiz) e o respeito ‘das determinações de procedimento referentes à divisão funcional interna’». Nem, muito menos, «intervenções a posteriori sobre as regras de competência e divisão funcional que, de alguma forma, ponham em causa os critérios pré-fixados na lei, ou seja, a ‘prévia fixação por lei de critérios objeti- vos gerais de repartição da competência’».
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