TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

142 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL definido pelo legislador; com efeito, dela decorre que, ainda que se não preencham no caso os requi- sitos objetivamente exigidos pelo legislador na norma atributiva de competência ao Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), este continua a ter competência para a instrução, somente por a ter tido para a prática de atos jurisdicionais durante a fase de inquérito; o cerne do problema não está na manipulação possibilitada pela norma – melhor, pela interpretação normativa – de que resulta a atri- buição da competência ao TCIC, ou seja, não releva o resultado, esse incerto, mas a causa, essa certa, estando o problema na própria interpretação normativa, não nas suas eventuais consequências. IV – A interpretação normativa em causa produz uma norma de densidade insuficiente para assegurar a predeterminação do juiz competente, o que justifica a intervenção do Tribunal Constitucional, na medida em que em causa está a garantia do juiz natural, a qual faz recair sobre o legislador o encargo de produzir normas orgânicas e processuais que contenham regras objetivas de estipulação do tribunal chamado a intervir em cada caso, impondo a exigência da determinabilidade, a aptidão das leis para estabelecer, com clareza, precisão e rigor, o juiz competente para cada caso. V – A norma sob apreciação, limitando-se a “estender” a um determinado tribunal (o TCIC) a competên- cia para realizar a fase de instrução, apenas porque era esse o tribunal competente para a prática dos atos jurisdicionais na fase de inquérito, sendo silente sobre as regras que definem a competência do tribunal para a realização desses atos, contende com uma das garantias do processo penal e de defesa do arguido consagradas no artigo 32.º da Constituição, preenchendo o seu n.º 9, sendo a questão tan- to mais digna de tutela quanto está aqui em causa a definição da competência de um tribunal criminal de primeira instância. VI – Se a Constituição limita a discricionariedade do legislador na instituição de tribunais com competên- cia exclusiva, é legítimo considerar, à luz dos princípios nela inscritos, que a discricionariedade judicial na interpretação e aplicação de normas de atribuição de competência aos tribunais assim instituídos também deve ser tida por limitada. VII – A norma sindicada, ao definir como critério de atribuição de competência ao TCIC para realização de instrução, a competência deste para a realização do inquérito, prescinde dos dois pressupostos de competência do TCIC, enunciados claramente pelo legislador no artigo 80.º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais (LOFTJ), para determinação “dos casos especiais de com- petência” – o elenco e a dispersão geográfica –, fazendo apelo a preceitos da LOFTJ, cujo objeto são ações, desta forma ignorando, desde logo, as especificidades próprias da jurisdição criminal, reconhe- cidas pelo legislador na definição das regras de competência da LOFTJ; e, por outro lado, desconsi- derando a ratio da distribuição de competências legalmente estabelecida nas várias fases do processo penal, que convocam competências diferenciadas, distinguindo a lei, no que diz respeito especifica- mente aos Tribunais de Instrução Criminal, as respetivas competências funcionais para: (i) praticar os atos jurisdicionais do inquérito, (ii) proceder à instrução e (iii) decidir a pronúncia. VIII – Ao neutralizar o vínculo de dependência entre a verificação dos pressupostos exigidos no artigo 80.º, n.º 1, da LOFTJ, e a atribuição da competência ao TCIC para proceder à instrução e decidir a pronún- cia, bastando-se com a prévia atribuição ao TCIC da competência para praticar os atos jurisdicionais no inquérito para lhe somar a competência para realizar a instrução, a norma em análise subestima a distinção legalmente assumida, na definição das competências do juiz de instrução criminal, entre as competên- cias funcionais relativas à realização da instrução e a competência para praticar os atos jurisdicionais do

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