TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
140 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL por quem comprovadamente não dispõe de meios económicos para suportar os custos que lhe são inerentes até que a compensação que reclamam junto do Estado seja satisfeita, entendimento que não é virtualmente apto a colocar em crise o invocado direito compensatório. Por outro lado, o direito ao trabalho (artigo 58.º da Constituição), na dimensão negativa que tutela a liberdade de exercício de uma atividade profissional, não pode querer significar a ausência de quaisquer restrições impostas pela necessidade de salvaguardar o conteúdo essencial de direitos conflituantes, que tam- bém assumem a natureza de direitos fundamentais, como é o caso do direito de acesso ao Direito e à tutela jurisdicional efetiva consagrado no n.º 1 do artigo 20.º da Lei Fundamental. Ora, considerando a natureza das funções atribuídas aos notários, no âmbito dos processos de inven- tário, por um lado, e o seu particular estatuto profissional, por outro, não merece censura constitucional, também a essa luz, a interpretação que, sem afastar o seu direito à compensação e ao reembolso das despesas suportadas, também ele garantido pela via judiciária (artigo 20.º da Constituição), determina o prossegui- mento dos autos de inventário instaurados por quem, sendo estranho a tal conflito, não dispõe de meios económicos para suportar os respetivos custos. 6. Finalmente, não se vê – nem a recorrente explica – que implicações ofensivas podem decorrer da interpretação sindicada para a tutela constitucional da liberdade de empresa e do setor económico privado ou para as normas conjugadas dos artigos 104.º e 165.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição. Na verdade, não estando em causa a obrigatoriedade de contribuição dos notários para a constituição do fundo a que se referia o n.º 2 do artigo 26.º da Portaria n.º 268/13, que nem sequer havia sido criado à data da prolação da decisão recorrida, mas apenas os efeitos processuais decorrentes do não pagamento prévio das despesas e honorários notariais, nas situações em que o requerente do inventário beneficia de apoio judiciário, na modalidade que o dispensa disso mesmo, carece, desde logo, de sentido lógico qualquer argumentação fundada nos invocados parâmetros constitucionais. Com efeito, o não reconhecimento do facto do não pagamento das despesas e honorários notariais, total ou parcial, como causa suspensiva do processo de inventário, nos casos em que o requerente beneficia de apoio judiciário, não configura, seja em que perspetiva for, apropriação ou eliminação do setor privado ou intromis- são estadual na gestão das empresas privadas. Por outro lado, manifestamente também não implica qualquer forma de tributação oculta que pudesse integrar a previsão do artigo 104.º da Constituição e o âmbito da reserva relativa de competência legislativa prevista no artigo 165.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição. Sendo infundadas, pelas aludidas razões, as arguições de inconstitucionalidade que a recorrente dirige à norma do artigo 26.º, n.º 2, da Portaria n.º 268/2013, de 26 de agosto, na interpretação sindicada, e nela não se descortinando quaisquer outras razões de censura constitucional, impõe-se, pois, a improcedência do recurso. 7. Pelo exposto, decide-se: a) Não julgar inconstitucional a norma extraída do artigo 26.º, n.º 2, da Portaria n.º 278/2013, de 26 de agosto, interpretada no sentido de que, até à constituição do Fundo nela previsto, o processo de inventário deve prosseguir sem o pagamento, pelo Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP, dos honorários notariais e despesas previstos nos seus artigos 15.º, 18.º e 21.º, nos casos em que o requerente é beneficiário de apoio judiciário, na modalidade de dispensa do paga- mento da taxa de justiça e demais encargos do processo; b) Negar, em consequência, provimento ao recurso. Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 unidades de conta. Lisboa, 20 de janeiro de 2016. – Carlos Fernandes Cadilha – Maria José Rangel de Mesquita – Lino Rodri- gues Ribeiro – Catarina Sarmento e Castro – Maria Lúcia Amaral.
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