TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
129 acórdão n.º 24/16 auxiliar no avivamento da memória de quem presta declarações em audiência ou na aferição da credibilidade desses depoimentos (cfr. o Acórdão n.º 90/13), cuja importância para a descoberta da verdade material não pode ser desprezada. Acresce que a solução legal não impede o arguido de, no exercício do contraditório, confrontar na audiência de julgamento a testemunha com as declarações feitas nesse momento e com eventuais contra- dições ou discrepâncias resultantes da leitura de declarações proferidas em momento processual anterior perante o Ministério Público, contrainterrogando-a ou oferecendo meios de prova que abalem a sua credi- bilidade. O princípio do contraditório, não é afastado nem a sua eficácia relativamente à formação da con- vicção do julgador se mostra diminuída. Por outro lado, mantém-se a salvaguarda estatuída no artigo 356.º, n.º 6, do CPP: proibição da leitura de depoimento prestado em inquérito ou instrução por testemunha que, em audiência, se tenha validamente recusado a depor. Ou seja, a leitura de autos contendo declarações anteriormente prestadas perante o Ministério Público não é um meio de prova substitutivo da inquirição em audiência, mas releva como importante instrumento auxiliar de valoração da prova testemunhal produzida em audiência: é com base no depoimento da testemu- nha produzido na audiência e, portanto sujeito a contraditório, seja por parte da acusação, recordando o que anteriormente foi dito pela mesma testemunha; seja por parte da defesa, contrainterrogando ou questionado a credibilidade da testemunha, que o tribunal forma a sua convicção. Por isso, e como bem refere o Ministé- rio Público, inexiste subversão ou ausência de contraditório, mas alargamento e aprofundamento, em vista de maior rigor na descoberta da verdade (cfr. a conclusão 26.ª das contra-alegações). Deste modo, a solução consagrada no artigo 356.º, n.º 3, do CPP, além de contribuir para a busca da verdade no quadro do processo criminal e para a consequente maior eficácia no combate ao crime e defesa da sociedade, não subtrai ao arguido meios de defesa legítimos nem afeta as condições da sua participação paritária na dialética inerente ao processo na fase da audiência de julgamento – por isso, não viola o direito ao processo equitativo previsto no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição; nem, por outro lado, impede ou dificulta desproporcionadamente a defesa do arguido, já que este pode na audiência de julgamento exercer plenamente o contraditório relativamente às testemunhas cujas declarações tenham sido lidas nessa mesma audiência – daí não ocorrer violação nem das garantias de defesa nem do princípio do contraditório consig- nados no artigo 32.º, n. os 1, 2 e 5, da Constituição. III – Decisão Pelo exposto, decide-se: a) Não julgar inconstitucional o artigo 356.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, quando interpre- tado no sentido de que «a leitura dos depoimentos testemunhais prestados no inquérito perante o Ministério Público é admitida, sem ser necessário o consentimento dos arguidos, quando aquela leitura se destine a avivar a memória de quem declare na audiência já não se lembrar de certos fac- tos, ou quando existir entre elas e as feitas na audiência discrepâncias ou contradições»; b) Não conhecer do objeto do recurso quanto às seguintes questões de inconstitucionalidade: – O artigo 170.º do Código de Processo Penal, interpretado no sentido de que recai sobre o arguido o ónus de indicar os meios de prova e requerer diligências por forma a habilitar o julgador a decidir pela falsidade do conteúdo material do ato judicial praticado no inquérito pelo Ministério Público; – O artigo 275.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, interpretado no sentido de que nada impede o Ministério Público que recorra exclusivamente «às funções do “corta e cola”», de pura e simplesmente “cortar” na íntegra o depoimento que consta do auto de inquirição da Polícia Judiciária e “colá-lo” na íntegra no auto das declarações perante si prestadas;
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