TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
126 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 2013: a conciliação prática entre, por um lado, a necessidade de celeridade e eficácia no combate ao crime e de defesa da sociedade; e, por outro lado, a garantia dos direitos de defesa do arguido (cfr. o n.º 1 da citada exposição de motivos). 11. No Acórdão n.º 90/13, além de se fazer uma descrição sobre a evolução legislativa quanto à admis- sibilidade de leitura na audiência de julgamento de autos de declarações prestadas anteriormente por assis- tentes ou testemunhas, são analisadas as razões e o tipo de vinculação constitucional do regime limitativo constante do artigo 356.º do CPP, na versão anterior à Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro: «[…] [2.2. …O] sistema em vigor é severamente limitativo quanto à leitura, durante a audiência de julgamento, das declarações de testemunhas e assistentes proferidas em sede de inquérito, perante o Ministério Público ou órgãos de polícia criminal. Apenas as admite, independentemente da finalidade dessa leitura, quando exista um acordo nesse sentido que englobe o Ministério Público, o arguido e o assistente. Isto tem como resultado, inexistindo esse acordo, a impossibilidade da sua utilização por parte do tribunal, não só na formação da sua convicção, mas também como instrumento auxiliar no avivamento da memória de quem presta declarações em audiência ou na aferição da credibilidade desses depoimentos. A esta solução preside a ideia inicial de que toda a prova em que se funde a convicção do julgador tem de ser realizada na audiência e segundo os princípios naturais de um processo de natureza acusatória (os princípios da imediação, da oralidade e da contraditoriedade na produção dessa prova), pelo que toda a derrogação a esta linha de pensamento só pode ser afirmada como exceção, justificada por um determinado circunstancialismo e regulada segundo um princípio de concordância prática dos valores conflituantes […]. Daí que, sendo a prova testemunhal em sentido amplo, quanto à sua formação, uma prova constituenda, como regra geral se proíba a admissão em julgamento da leitura de anteriores declarações processuais. Na verdade, este tipo de prova, em fase de julgamento, só está imune a qualquer juízo de desconfiança, relativamente à sua autenticidade e credibilidade, quando ela é produzida perante o julgador, aos olhos do público e com o contributo dialético dos sujeitos processuais. É essa desconfiança que, na opção legislativa, não permite a transmissibilidade daquelas declarações para a fase de julgamento, sobretudo quando elas não foram prestadas perante um juiz, dado que, quando a entidade inquiridora foi o Ministério Público ou um órgão de polícia criminal se entende que as expectativas de quem procede à inquirição, que resultam da hipótese formulada para a investigação ou da convicção formada por outros indícios já recolhidos, têm influên- cia sobre as declarações recolhidas […]. O legislador, porém, não entendeu dotar esta proibição de prova duma força que a subtraísse ao funciona- mento duma ideia, com problemática aceitação no processo penal, de autorresponsabilidade probatória das partes, numa dimensão que lhes confere poderes para disporem, por consenso, sobre a validade de determinadas provas [….]. Encontrando-se todos os sujeitos processuais de acordo quanto à admissibilidade da leitura de declarações prestadas por assistentes e testemunhas, em fase anterior à do julgamento, cessa a preocupação com as desconfian- ças que a valia de tais declarações poderia suscitar, uma vez que os eventuais afetados pela utilização dessa prova pré-constituída manifestam a sua vontade dela ser usada, sendo certo que o julgador avaliará sempre livremente da sua relevância, segundo as regras da experiência e a sua convicção (artigo 127.º, do Código de Processo Penal). Se os titulares de interesses juridicamente relevantes no processo penal reconhecem, numa opinião unânime, que, apesar das circunstâncias em que foi produzida aquela prova, ela pode ser útil para o julgamento do pleito, a sus- peição que sobre ela recaía deixa de ter razões que impeçam a sua ponderação. […] Já vimos que a regra da proibição de utilização de depoimentos prestados perante outras entidades que não um juiz, em fases do processo anteriores ao julgamento, mesmo como um mero instrumento auxiliar de valoração da prova produzida em audiência, tem o seu fundamento nas desconfianças sobre a fiabilidade dos depoimentos prestados à margem dos princípios da imediação, da oralidade e da contraditoriedade na produção da prova, e obtidos sob a direção de uma entidade que não disponha da garantia judicial. Se tais depoimentos podem suportar
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=