TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
123 acórdão n.º 24/16 e a nulidade das próprias provas, pelo que o tribunal recorrido não poderia ter dado como provado que a atividade de narcotráfico desenvolvida pelos recorrentes prosseguiu e progrediu através da venda de produto estupefaciente a número de consumidores não concretamente apurado, entre os quais as testemunhas cujos depoimentos prestados perante o Ministério Público em sede de inquérito e registados em auto foram lidos em audiência (cfr. as conclusões 19 a 40 e 42 a 46 das alegações). Porém, a questão de saber se a norma aplicada pelo tribunal a quo corresponde à melhor interpretação do direito extravasa do âmbito do presente recurso, uma vez que o Tribunal Constitucional, num recurso de constitucionalidade interposto ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b) , da LTC, só pode julgar inconsti- tucional «a norma que a decisão recorrida tenha aplicado» (cfr. o artigo 79.º-C da LTC). Importa, isso sim, indagar da respetiva inconstitucionalidade. Aliás, foi isso que fez o tribunal recorrido e é isso que também pedem os recorrentes no presente recurso, ainda que, em termos argumentativos, e contrariamente ao que sucede quanto à legalidade da interpretação questionada, se limitem a referir genericamente os parâmetros que têm por violados (cfr. as conclusões 18, 19, 38, 41 e 48 das alegações; vide também a conclusão 14.ª das contra-alegações). 9. O tribunal a quo analisou a questão da constitucionalidade do artigo 356.º, n.º 3, do CPP, nos seguintes termos: «Para os recorrentes, a previsão do artigo 356.º, n.º 3, é inconstitucional, quando interpretado no sentido de permitir a leitura das declarações prestadas perante o Ministério Público sem a concordância do arguido, por violação do artigo 20.º, n.º 4 e 32.º, n.º 1, 2 e 5, da Constituição da República Portuguesa e artigo 6.º da CEDH. Porém, sem razão. O artigo 20.º da Constituição da República garante o acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva, assegu- rando, além do mais, no seu n.º 4, que «todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objeto de decisão em um prazo razoável e mediante um processo equitativo». «A exigência de um processo equitativo, constante do artigo 20.º, n.º 4, se não afasta a liberdade de confor- mação do legislador na concreta estrutura do processo, impõe, antes de mais, que as normas processuais propor- cionem aos interessados meios de defesa dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos e paridade entre as partes na dialética que elas protagonizam no processo (Acórdão n.º 632/99). Um processo equitativo postula, por isso, a efetividade do direito de defesa no processo, bem como um dos princípios do contraditório e da igualdade de armas [Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2005, p. 192]. O artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa dispõe, nos seus n. os 1 e 5, que «o processo criminal assegurará todas as garantias de defesa», revestindo estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os atos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório. «Quando aquele preceito se reporta a “todas as garantias de defesa”, considera indubitavelmente todos os direitos e instrumentos necessários e adequados a defender a sua posição e a contrariar a acusação. O posicio- namento do arguido num processo de tipo acusatório há de revestir-se numa situação de reciprocidade dialética face à acusação, pelo que, em conformidade, devem ser-lhes atribuídos aqueles meios legais de intervenção que compensem o desequilíbrio, que é pressuposto indispensável de uma correta administração da justiça» [Acór- dão do Tribunal Constitucional n.º 1052/96]. Não podemos, contudo, esquecer, como se afirma no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 21 de março de 2007, porque «os princípios da publicidade, contraditório, imediação e oralidade (...) mais do que garantias de defesa, são instrumentos que conduzem à descoberta da verdade, na qual se tem de fundar a realização da justiça, só podem, por regra, valer em julgamento, «nomeadamente para o efeito da formação da convicção do tribunal» as provas que tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência (artigo 355.º, n.º 1, do Código de Processo Penal).
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