TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

46 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 359.º, n.º 1, da LTFP), pelo que a previsão legal de legitimidade para a celebração de acordos, pelo artigo 364.º, n.º 3, alínea b) , LTFP, implica a atribuição de competência para a sua negociação. Nos termos do n.º 6 do mesmo artigo, tem legitimidade para a assinatura desses acordos, pela parte pública, os membros do Governo e os representantes do empregador público. Embora se vise a celebração de um único acordo coletivo, a norma prevê que a atribuição de legiti- midade, pelo lado público, a uma pluralidade de entidades − para além do empregador, devem negociar e celebrar o acordo os membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública. Assim, a norma impugnada faz depender a vigência do acordo da concordância do Governo. O requerente faz assentar a sua argumentação na violação pelas normas impugnadas do princípio da autonomia local, acolhido no artigo 6.º, n.º 1, da Constituição. Alega que, dependendo a celebração de um acordo coletivo de empregador público, no âmbito da administração autárquica, obrigatoriamente, por força das regras de legitimidade, da concordância dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública, na qualidade de cocontratantes, a ausência dessa anuência acarreta necessariamente a impossibilidade de outorga do acordo coletivo pelo empregador público autárquico interessado. Isto traduz-se na atribuição de um poder de “veto” ao Governo, que pode bloquear o acordo, sempre que não concorde com as soluções preconizadas pelo empregador público local e pelas associações sindicais. Como refere o requerente, a questão de constitucionalidade coloca-se perante a impossibilidade «de as autarquias locais e os seus traba- lhadores (neste caso, através das associações sindicais) lograrem autonomamente acomodar o respetivo regime laboral, dentro daquela que é a margem legalmente aberta à regulação por este tipo de acordos coletivos de trabalho», perante «a falta de concordância dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública, quanto à celebração de acordo coletivo» (14.º do requerimento). Este mecanismo de bloqueio do poder e liberdade de contratação coletiva deve ser considerado violador da autonomia local. 16. A autonomia em matéria de pessoal é um dos «elementos» constitutivos da autonomia local con- sagrada na Constituição (Gomes Canotilho/ Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada , vol. II, Coimbra Editora, 2010, p. 750) e abrange o poder de as autarquias disporem de «quadros de pessoal próprio», ou seja, distintos dos do Estado ou das Regiões (artigo 243.º, n.º 1, da Constituição). A existência de mapas de pessoal próprio significa que os trabalhadores «das autarquias não são funcio- nários do Estado, mas delas mesmas; cada autarquia tem um corpo próprio de funcionários, independente do Estado e das demais autarquias. Por outro lado, as autarquias podem criar autonomamente, nos limites da lei, os seus quadros de pessoal necessário para a gestão das suas atividades, segundo o princípio da liberdade de escolha do sistema de organização» (Gomes Canotilho/ Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. II, p. 750). Como se afirma no Preâmbulo da Carta Europeia de Autonomia Local, esta «supõe a existência de autarquias locais dotadas de órgãos de decisão constituídos democraticamente e beneficiando de uma ampla autonomia quanto às competências, às modalidades do seu exercício e aos meios necessários ao cumprimento da sua missão». Estabelece o artigo 9.º, n.º 1, desta Carta que «as autarquias locais têm direito, no âmbito da política económica nacional, a recursos próprios adequados, dos quais podem dispor livremente no exercício das suas atribuições». Nestes recursos incluem-se os recursos financeiros mas também os recursos humanos necessários e adequados à “prossecução dos interesses próprios das populações”. Aos trabalhadores em funções públicas das autarquias locais é aplicável o mesmo regime jurídico do dos trabalhadores do Estado, «com as adaptações necessárias, nos termos da lei» (artigo 243.º, n.º 2) «tanto no que respeita ao regime constitucional como no que se refere ao regime legal». As “adaptações necessárias” sal- vaguardam, no entanto, «regimes próprios referentes à constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na administração local» e a «autonomia contratual» (Gomes Canotilho/ Vital Moreira, ob. cit. , p. 750). Assim, «a equivalência de regimes jurídicos não obsta a que o legislador disponha de modo diverso para os trabalhadores da administração local. Não exclui a diferenciação de regimes laborais. Não por acaso, por isso, o n.º 2 alude às “necessárias adaptações”» (J. Miranda/ A. Fernanda Neves, anotação ao artigo 243.º, in Constituição Portuguesa Anotada, J. Miranda/ R. Medeiros (org.), tomo III, Coimbra Editora, 2007, p. 508).

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