TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

319 acórdão n.º 539/15 nos primeiros, não tendo o legislador constitucional relevado como fator merecedor de uma distinção em matéria competencial o facto de nas contribuições financeiras essa bilateralidade se apresentar muitas vezes como potencial e/ou difusa. Se a jurisprudência constitucional anteriormente à Revisão de 1997, perante a ausência de previsão na Constituição dos tributos parafiscais, por cautela, preferiu equiparar as contribuições financeiras aos impostos, relevando aquela caraterística, outra foi a opção do legislador constituinte de 1997 que entendeu preferível tratar do mesmo modo as contribuições financeiras e as taxas, diferenciando estes dois tributos dos impostos, em matéria de reserva parlamentar. Não sendo a existência de um regime geral pressuposto necessário da criação de taxas, nem de contribui- ções financeiras, não tem qualquer suporte no texto constitucional, na ausência daquele regime, estender-se a competência reservada da Assembleia da República ao ato de aprovação de contribuições financeiras indi- vidualizadas, criando-se assim uma reserva integral de regime onde esta não existe. Como afirmaram Ale- xandre Sousa Pinheiro e Mário João de Brito Fernandes, “na ausência de regime geral não pode o intérprete subverter a vontade do legislador (constituinte ordinário) criando uma reserva integral” (in Comentário à IV Revisão Constitucional , p. 417, edição de 1999, da Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa). O Tribunal Constitucional logo extraiu estas conclusões relativamente à aprovação de taxas individua- lizadas por ato legislativo do Governo não autorizado, sem que a Assembleia houvesse aprovado um regime geral das taxas (Acórdãos n. os  38/00 e 333/01), não havendo razões para que, relativamente à criação de contribuições financeiras, se estabeleça uma solução diversa, efetuando uma distinção onde o texto consti- tucional não distingue. Assim, a ausência da aprovação de um regime geral das contribuições financeiras pela Assembleia da República não pode impedir o Governo de aprovar a criação de contribuições financeiras individualizadas no exercício de uma competência concorrente, sem prejuízo da Assembleia sempre poder revogar, alterar ou suspender o respetivo diploma, no exercício dos seus poderes constitucionais. Por estas razões conclui-se que o artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 119/2012, de 15 de junho, não viola a reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República estabelecida no artigo 165.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição. 3. Da alegada inconstitucionalidade material A recorrida, que nas suas contra-alegações defendeu a manutenção da decisão recorrida, invocou tam- bém a inconstitucionalidade material das normas que são objeto do presente recurso, por violação do prin- cípio da equivalência em matéria de contribuições financeiras, como expressão do princípio da igualdade (artigo 13.º da Constituição). Não estando o Tribunal Constitucional limitado à apreciação das razões que o tribunal recorrido aduziu para recusar a aplicação das normas sub iudicio , com fundamento na sua inconstitucionalidade, conforme expressamente se dispõe no artigo 79.º-C da LTC, cumpre-lhe verificar se a normação sindicada padece do arguido vício de inconstitucionalidade material. Em primeiro lugar, há que reconhecer que, estando em causa um tributo que visa compensar prestações administrativas de que o sujeito passivo, por força da pertença a um grupo (titulares de estabelecimentos de comércio alimentar de produtos de origem animal e vegetal, frescos ou congelados, transformados ou crus, a granel ou pré-embalados), é presumível beneficiário – assumindo, por isso, natureza comutativa –, é consti- tucionalmente pertinente avaliar a sua legitimidade material à luz do princípio da igualdade (artigo 13.º da Constituição), concretizado no invocado princípio da equivalência. Este princípio aplicado às contribuições financeiras diz-nos que estas devem ter uma relação de equi- valência com o valor do benefício obtido ou o custo provocado pelos sujeitos passivos dessas contribuições, devendo ter-se em conta que essa equivalência não é sinalagmática, uma vez que as contribuições financeiras respeitam a feixes de prestações difusas que apenas podemos presumir provocadas ou aproveitadas por certos grupos de contribuintes.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=