TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

262 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL confiaram na inexistência da projeção sobre o passado dos efeitos das novas decisões legislativas. E essa valo- ração só pode incidir sobre a consistência das posições jurídicas subjetivas definidas à luz do Direito anterior, e que vêm agora, pela lei nova, a ser afetadas. Na verdade, as “expectativas” dos particulares na continuidade, e na não disrupção, da ordem jurídica, não são realidades aferíveis ou avaliáveis no plano empírico dos factos. A sua densidade não advém de uma qualquer pré-disposição, anímica ou psicológica, para antecipar men- talmente a iminência ou o risco das alterações legislativas; a sua densidade advém do tipo de direitos de que são titulares as pessoas afetadas e o modo pelo qual a Constituição os valora. O ponto é importante, uma vez que, como se disse no Acórdão n.º 862/13, quanto mais consistente for o direito do particular, mais exigente deverá ser o controlo da proteção da confiança. Assim, a metódica a seguir na aplicação deste critério implica sempre uma ponderação de interesses con- trapostos: de um lado, as expectativas dos particulares na continuidade do quadro legislativo vigente; do outro, as razões de interesse público que justificam a não continuidade das soluções legislativas (cfr. Acórdão n.º 862/13). Os particulares têm interesse na estabilidade da ordem jurídica e das situações jurídicas cons- tituídas, a fim de organizarem os seus planos de vida e de evitar o mais possível a frustração das suas expec- tativas fundadas; mas a esse interesse contrapõe-se o interesse público na transformação da ordem jurídica e na sua adaptação às novas ideias de ordenação social. Caso os dois grupos de interesses e valores sejam reco- nhecidos na Constituição em condições de igualdade, impõe-se em relação a eles o necessário exercício de confronto e ponderação para concluir, com base no peso variável de cada um, qual o que deve prevalecer. O método do juízo de avaliação e ponderação dos interesses relacionados com a proteção da confiança é igual ao que se segue quando se julga sobre a proporcionalidade ou adequação substancial de uma medida restritiva de direitos. Mesmo que se conclua pela premência do interesse público na mudança e adaptação do quadro legislativo vigente, ainda assim é necessário aferir, à luz de parâmetros materiais e axiológicos, se a medida do sacrifício é «inadmissível, arbitrária e demasiado onerosa» (cfr. Acórdão n.º 287/90). 12. Como acima mencionado (vide supra o n.º 10), para o tribunal recorrido, o grau académico con- ferido pelos cursos superiores mencionados no artigo 34.º, n.º 1, da Lei de Base dos Sistema Educativo deve garantir a possibilidade de ingresso na carreira docente, “sendo apenas lícito ao legislador estabelecer os contornos quanto ao modus de adquirir as sobreditas competências no âmbito e aquando do processo de formação superior dos professores (ou seja, ex ante e não ex post, uma vez que o ponto de referência é o da formação para a carreira docente e não o respetivo ingresso” (fls. 128). Por isso, a prova de avaliação em análise, ao consubstanciar um “ novo obstáculo ao ingresso no quadro público para o exercício da docência” ( ibidem ; itálico aditado), frustrou as expectativas tanto daqueles “que já haviam terminado a respetiva qua- lificação universitária”, como dos que “ingressaram na respetiva formação académica com o fito de alcança- rem a sobredita inserção no quadro” ( ibidem ). Acresce que a introdução de tal «obstáculo» não se encontra devidamente justificada em termos de interesse público (fls. 128-129) – aliás, a mesma é contraditória com a responsabilidade do Estado de assegurar a preparação académica dos futuros profissionais do ensino – e não foi acompanhada de soluções transitórias que acautelassem as legítimas expectativas de formandos e formados (fls. 130-131). Contudo, nenhuma destas razões é exata ou convincente. 12.1. Em primeiro lugar, importa ter presente que os problemas atinentes à qualificação para a profis- são de professor e ao ingresso na carreira docente respeitam a um núcleo problemático comum ao sistema educativo e à própria organização estrutural da função pública. A habilitação para a docência não significa a aquisição de um direito a ingressar na carreira docente. O artigo 34.º da Lei de Bases do Sistema Educativo visa, isso sim, concretizar o princípio geral em matéria de formação inicial enunciado no seu artigo 33.º, n.º 1, alínea a) : a formação dos professores assenta numa formação inicial de nível superior que proporcione aos “educadores e professores de todos os níveis de educação e ensino a informação, os métodos e as técnicas

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