TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015
208 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL colegial (cfr. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de dezembro, que introduziu a nova redação do artigo 705.º do Código de Processo Civil). Em todo o caso, o artigo 94.º, n.º 3, do CPTA, em consonância com o elenco dos poderes conferidos ao juiz ou relator no artigo 27.º, n.º 1, alínea i) , esclarece que a prolação de decisão sumária apenas tem lugar em duas situações: (a) quando a questão de direito a resolver seja simples, designadamente por já ter sido apreciada por tribunal, de modo uniforme e reiterado; (b) quando a pretensão seja manifestamente infun- dada. Ou seja, o juiz pode optar por uma decisão sumária, avocando a competência que está atribuída à for- mação de três juízes, quando a ação verse sobre aspetos que foram já analisados pela jurisprudência de modo uniforme (seja pelos tribunais de primeira instância, seja pelos tribunais superiores), sem que tenha sido aduzida argumentação inovadora e suscetível de por em causa a corrente jurisprudencial já formada, caso em que basta ao juiz ou relator remeter para as precedentes decisões, de que juntará cópia; ou quando, pela análise meramente liminar dos fundamentos invocados seja possível concluir, com segurança, que as questões suscitadas são manifestamente improcedentes (neste sentido, Mário Aroso de Almeida/Carlos Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3.ª edição, Coimbra, p. 631). No entanto, a transposição para a primeira instância de mecanismos de julgamento que eram tradi- cionalmente aplicáveis nas instâncias de recurso, ainda que possa encontrar-se justificada por considerações de política legislativa (cfr. Mário Aroso de Almeida, Manual de Processo Administrativo, Coimbra, 2010, p. 403), não deixa de suscitar diversas dificuldades interpretativas, que põem em causa não apenas a deter- minabilidade da lei mas também outros aspetos atinentes à realização do processo equitativo e do princípio da segurança jurídica. Introduz-se, desde logo, um maior grau de dúvida quanto à definição do órgão judicial interveniente face à deslocação da competência com base na utilização de conceitos jurídicos indeterminados, como são aqueles que permitem a prolação de decisão sumária (questão de direito simples; pretensão manifestamente infundada). Por outro lado, as normas do artigo 27.º, n.º 1, alínea i) , e n.º 2, do CPTA, quando interpretadas no sentido de imporem a reclamação para a conferência de decisão sumária proferida pelo relator em primeira instância, estão em antinomia com o artigo 142.º, n.º 1, do mesmo Código, que, sem qualquer ressalva, permite genericamente o «recurso das decisões que, em primeiro grau de jurisdição, tenham conhecido do mérito da causa» nos processos de valor superior à alçada do tribunal de que se recorre, aí se incluindo necessariamente o recurso de decisão sobre o fundo da causa que tenha sido proferida pelo relator no uso da competência deferida pelo artigo 94.º, n.º 3. O que poderá abrir caminho a uma interpretação restritiva do n.º 2 do artigo 27.º de modo a considerar a reclamação para a conferência aí prevista como sendo aplicável apenas a despachos ou decisões que não sejam diretamente objeto de recurso nos termos gerais em que este é legalmente admitido. A que acresce um outro fator de incerteza. É que, em certas eventualidades, o recurso baseia-se em fundamentos absolutos, isto é, em fundamentos que tornam o recurso admissível independentemente dos valores da causa e da sucumbência, sendo esse o caso, designadamente, quando o recurso tenha como funda- mento a violação das regras da competência absoluta do tribunal [artigo 678.º, n.º 2, do Código de Processo Civil a que corresponde o artigo 629.º, n.º 2, alínea b) , do Novo Código de Processo Civil]. O que permite afastar a subsidiariedade do recurso em relação à reclamação para a conferência quando o relator, em violação das regras de competência definidas para o juiz singular, tenha avocado o poder decisório fora do condiciona- lismo previsto no artigo 94.º, n.º 3, do CPTA. Neste caso, haveria sempre lugar a recurso e não a reclamação, visto que não faria sentido que o controlo da decisão impugnada fosse levado a efeito através de um meio de reação a apresentar perante um dos órgãos judiciários cuja competência é questionada. 5. Neste condicionalismo, bem se compreende que o juiz de primeira instância a quem tenha sido distribuído o processo e funcione como relator deva, não só invocar a norma habilitante, como explicitar
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