TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
99 acórdão n.º 403/15 do Estado que a Constituição expressamente refere – para além disto, dizíamos, colhe-se a ideia de uma manifesta adequação da medida legislativa à prossecução do fim a que se destina (obtenção de informações relevantes para a atividade dos Serviços integrados no SIRP). A obtenção de “dados de tráfego, de localização ou outros dados conexos das comunicações, necessários para identificar o assinante ou utilizador ou para encontrar e identificar a fonte, o destino, a data, a hora, a duração e o tipo de comunicação, bem como para identificar o equipamento de telecomunicações ou a sua localização” é manifestamente adequada – no contexto da atuação dos serviços de informações – ao funcionamento do ciclo de produção de informações, permitindo, designadamente, estabelecer a (essencial) conexão entre pessoas e lugares que aqueles Serviços tenham por carecidos de análise. Sublinhar-se-á aqui, relativamente ao fenómeno terrorista contemporâneo, enquanto ameaça bem presente nas sociedades dos nossos dias, o desenvolvimento deste em rede, através de conexões (contactos) entre pessoas em pontos geográficos afastados, em termos que tornam intuitiva, como matéria-prima informacional, a deteção e relacionação desses contactos. A necessidade ou exigibilidade, por sua vez, traduzida na impossibilidade de adoção de medidas menos intrusivas com os mesmos efeitos na prossecução do fim visado, também deve ter-se aqui por estabelecida, uma vez que aos Serviços de Informações será, hoje mais ainda do que até agora, imprescindível a recolha dos identificados dados de tráfego, precisamente para estabelecimento das apontadas conexões entre informações dispersas, em vista da formação de um quadro informacional coerente. Trata-se, basicamente, de propiciar acesso a elementos determinantes para a alimentação e regular constituição e funcionamento do ciclo de pro- dução de informações. E é este um resultado que não poderia obter-se por via menos intrusiva, certamente inalcançável através dos vagos e imprecisos dados de base. Os instrumentos resultantes daquele n.º 2 tradu- zem, assim, a já assinalada “menor desvantagem possível” no (necessário) sacrifício de algo na esfera pessoal de reserva de intimidade, entendida como direito à autodeterminação informativa. 11.3. É mais complexa, no entanto – desde já se adianta –, a verificação da proporcionalidade em sentido estrito. Para concluir no sentido da “justa medida” da solução legislativa, importa considerar: (i) a espécie de informação obtida; (ii) a escala da informação; (iii) o funcionamento das comissões de fiscalização; e, face ao quadro precedente, concluindo, (iv) o sentido das exigências de proporcionalidade. A espécie de informação obtida é, como já se referiu, pela sua natureza, limitada (dados de tráfego) e, pese embora afete uma projeção da reserva da intimidade da vida privada, não afeta esse tipo de informação, longe disso, essa intimidade projetiva, com uma intensidade igual ou mesmo equivalente à afetada pela infor- mação resultante dos próprios dados de conteúdo, que permanecem – é essa a opção do legislador português – inacessíveis aos Serviços de Informações. Mais importante para apurar o sentido da proporcionalidade é, todavia, o que designamos pela escala da informação. Como já referimos, atualmente, o debate internacional sobre a privacidade das comunicações tem como principais alvos sistemas muito complexos, alguns deles já referidos neste texto. Em tais casos, trata-se da recolha sistemática de informações, realizada em massa, com ténue ou sem qualquer circunscrição de pessoas, tempo e lugares, sem uma prévia verificação da utilidade concreta da grande maioria da informa- ção recolhida, tendo em vista o seu tratamento posterior e assentando na expectativa da sua utilidade futura, para estabelecimento de conexões entre pessoas que venham a ser suspeitas de ameaçar ou de lesar os interes- ses do Estado. Tal recolha de informações é, na sua escala, absolutamente dissociada do que se prevê no artigo 78.º, n.º 2 do Decreto n.º 426/XII: tão-só, um acesso pontual, delimitado por circunstâncias concretas, que tem de ser previamente solicitado a uma comissão independente, alegando e justificando a necessidade, adequação e proporcionalidade do acesso, por referência às atribuições legais dos Serviços de Informações. Por outro lado, como já se assinalou, a atividade do SIRP é fiscalizada por três comissões independentes, sendo que a sua atuação garante – especificamente a da Comissão de Fiscalização de Dados do SIRP – o apagamento dos dados que não interessam à atividade dos serviços, por serem ou terem deixado de ser úteis. Ademais – e é este um ponto de particular importância –, centrando a nossa atenção na Comissão de Con- trolo Prévio, à qual cabe em exclusivo autorizar o acesso aos dados de tráfego, é visível o esforço do legislador
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=