TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

87 acórdão n.º 403/15 uma componente específica dessa atividade, tal como a ação encoberta [ covert action ]”. Todavia, “[…] a característica comum e principal desta atividade reside no seu caráter sensível, por questões de propriedade e de legalidade, mas principalmente por razões de vulnerabilidade das suas fontes e métodos à adoção de contramedidas […]. Daqui decorre o caráter secreto da atividade de informações: o secretismo constitui a imagem de marca das informações, a base da sua relação com o governo (com o destinatário da informação) e a sua própria autoimagem” (Michael Herman, “Intelligence Services” in The Information Age, Londres, 2002, pp. 3/4). Como conclusão diremos, enfim, que estas diversas definições projetam a matriz militar milenar das informações [que remonta à A Arte da Guerra de Sun Tzu (Sunzi), possivelmente escrita no Século VI antes da era comum] e poderiam, sem perda de rigor, ser reduzidas à caracterização que Richard Posner nos dá de intelligence dizendo que “[o] objetivo da ‘produção de informações’ [the goal of intelligence] é o conhecimento das intenções e das capacidades de inimigos potenciais” ( Preventing Surprise Attacks. Intelligence Reform in the Wake of 9/11 , Nova York, Oxford, 2005, p. 99). 8. O elemento central na previsão da norma objeto, o que é questionado na sua conformidade consti- tucional pelo Requerente, refere-se à natureza dos dados relativos às telecomunicações facultados aos oficiais de informações, mediante autorização da Comissão de Controlo Prévio. Tratam-se de dados de tráfego – de localização ou outros dados conexos das comunicações, necessários para identificar o assinante ou utilizador ou para encontrar e identificar a fonte, o destino, a data, a hora, a duração e o tipo de comunicação, bem como para identificar o equipamento de telecomunicações ou a sua localização. São estes elementos que a exposição de motivos que acompanhava a proposta de lei do Governo que esteve na origem do Decreto n.º 426/XII (cfr. o artigo 3.º do pedido) qualificava, não com total rigor, como correspondendo a metadados, enquanto conceito intuído como apropriado aos dados de tráfego. Todavia, o emprego desta expressão – metadados – no contexto que aqui nos interessa é suscetível de criar equívocos. Com efeito, na ciência da computação, corresponde o conceito de metadados, usualmente definidos como “dados sobre dados” (“ [m]etadata is simply data about data […] ”, Jembaa Cole, “When invisible electronic ink leaves red faces: tactical, legal and ethical consequences of the failure to remove meta- data”, disponível em: https://digital.law.washington.edu/ ) , à separação, dentro de uma determinada realidade significativa, entre um núcleo que qualificaríamos de central, correspondente à própria realidade, e elemen- tos periféricos, laterais, a ela ligados por alguma relação ou ponto de contacto, os quais, não contendo essa realidade em si mesma, expressam algum tipo de contexto circundante da mesma, relacionado mas separado dela. É assim que os metadados são referidos, na ciência da computação, como “[…] informação estatística não visível respeitante a um determinado documento, gerada por um programa de software […]” [Jembaa Cole, “When invisible electronic ink leaves red faces (…)”, cit.]. A utilidade destes elementos refere-se espe- cialmente à gestão de bases ou de grandes bancos de dados (armazéns de dados, data warehouse ), no sentido em que permitem parametrizar determinados elementos – nomes, números, relações lógicas redutíveis a um predicado verbal – e, através destes, procurar conexões relevantes (procurar informação útil) dentro de uma base de dados, evitando a necessidade de realizar uma procura através da “localização física”, documental, dessas conexões (como paradigmaticamente ocorre numa procura com ficheiros em suporte de papel). Ora, os dados de tráfego aqui em causa são (contêm) informação em si mesmos, permitem o estabe- lecimento de conexões entre pessoas e situações, tomando como ponto de partida a existência pretérita de uma determinada comunicação, esgotando-se o seu sentido numa extrapolação analítica realizada com base na existência dessa comunicação e das relações que ela indica, não com base no conteúdo da própria comu- nicação. Tal circunstância introduz, desde logo, o elemento central – por vezes objeto de confusão numa discussão superficial – da caracterização dos dados de tráfego, qualificados como metadados, referidos, como aqui sucede, às telecomunicações, distinguindo (separando) estes do próprio conteúdo da comunicação (a mensagem em si mesma). É com este sentido, num debate que envolve frequentemente a ponderação do sig- nificado do acesso das autoridades públicas aos chamados metadados (se entendidos como dados de tráfego),

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