TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
86 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL particular o terrorismo (ao qual se refere a Lei n.º 52/2003, de 22 de agosto) a espionagem e outros dos crimes contra o Estado, fundamentalmente os elencados no Título V do Código Penal, constituindo estes exemplos paradigmáticos que justificam essa intervenção precoce correspondem ao espaço de referência da defesa da Constituição. 7. A função de produção de informações – a atividade dos serviços de informações – no quadro institu- cional dos organismos do Estado dedicados a essa tarefa (que são, no nosso caso, os organismos integrantes do SIRP), traduz-se na incumbência funcional de “[…] assegurar, através dos serviços de informações, no estreito respeito da Constituição e da lei, a produção de informações necessárias à salvaguarda da segurança interna e externa, da independência e interesses nacionais e da unidade e integridade do Estado” (artigo 2.º do Decreto n.º 426/XII). Esta tarefa recai, no quadro do SIRP, sobre dois Serviços: o Serviço de Informações de Segurança (artigo 56.º do Decreto n.º 426/XII), que é um serviço dedicado à produção de informações de segurança interna, e o Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (artigo 57.º do mesmo Decreto), que é um serviço de informações reportado à vertente externa (exterior ao território nacional) da segurança do Estado português e da projeção externa dos seus interesses. Tratam-se estas de caracterizações cuja essência decorre da atribuição funcional, com âmbitos distintos (a segurança externa e a segurança interna), da tarefa de produção de informações. Atividade correspondente – e as definições legais pressupõem e acomodam-se a esta ideia – à procura de um conhecimento sistemati- zado, qualitativamente superior, projetado no futuro, no sentido em que se exprime através da formulação de previsões, visando a eliminação ou a redução da incerteza, num quadro de competição ou de conflito, com o sentido de habilitar o destinatário do produto assim criado na tomada de decisões. A informação – as informações com este sentido – não se reduzem à procura de meras notícias mais ou menos contextualizadas, que expressam, quanto muito, a matéria-prima (a informação em bruto) a partir da qual se produzem, após processamento, as informações funcionalmente atribuídas aos Serviços de Informações. A atividade de produção de informações, no sentido aqui relevante, expressa-se, assim – e seguimos aqui um texto de Arménio Marques Ferreira, “O Sistema de Informações da República Portuguesa”, em Estudos de Direito e Segurança, Coimbra, 2007, p. 69 –, em elementos sistematizados em quadros interpretativos, através de critérios que sobrepõem a estrutura de sentido à relação causal (projetam o significado de uma realidade complexa em si mesma), que são produzidas através de uma ferramenta metodológica específica, de um método próprio [habitualmente referido como o ciclo de produção de informações: (i) orientação da pesquisa, (ii) pesquisa, (iii) análise, (iv) difusão da informação], método este que se reproduz funcionalmente dentro de um serviço de informações, na divisão entre áreas de pesquisa e áreas de análise, elementos esses que são preservadas do conhecimento de terceiros através de procedimentos protetivos próprios, correspon- dentes, na sua vertente normativa, à ideia de segredo de Estado. Trata-se, pois, quando falamos da produção de informações, de caracterizar um tipo especial de conhe- cimento – um conhecimento interpretativo qualificado – e de o referir, na sua origem, a estruturas organiza- cionais, os Serviços de Informações, assentes numa metodologia de trabalho própria, dedicados à produção desse tipo de conhecimento. Nas palavras de Robert Gates, as informações lidariam primordialmente com segredos: os segredos, porque passíveis de ser descobertos, situar-se-iam num plano de cognoscibilidade direta correspondente ao que é “claro” – ao que se torna claro quando é descoberto, aliás. Depois viriam os mistérios, situando-se estes numa zona de ambiguidade intrínseca que nunca fornece respostas claras. A tarefa da análise seria solucionar, por via dos segredos descobertos, os mistérios que ensombram o processo de tomada de decisão, eliminando ou diminuindo substancialmente o fator incerteza (adaptámos aqui a caracterização por Robert Gates da atividade de análise, in Intelligence Requirements for the 1990’s: Collection, Analysis, Counterintelligence, and Covert Action, ed. Roy Godson, Washington, 1989, p. 115). Assim, constitui a essência da função de produção de informações – da função de “inteligência” (o vocábulo apropriado à designação das informações que teimosamente se recusa a entrar no nosso léxico) – a “[…] recolha e tratamento da informação, sendo que a análise, recorrendo a todo o tipo de fontes, traduz
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