TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

77 acórdão n.º 403/15 conformam constitucionalmente o processo criminal. Assim, as razões que justificaram a exceção expres- samente mencionada no n.º 4 do artigo 34.º da CRP, que se prendiam, precisamente, com as específicas garantias existentes em processo criminal, não se verificam no presente caso. Por conseguinte, também a resposta à segunda questão que foi colocada pelo requerente neste processo é seguramente negativa: a Comissão Prévia de Controlo é um órgão administrativo que não tem poderes equivalentes a uma intervenção em processo criminal. III – Decisão Pelo exposto, ao abrigo do artigo 278.º da Constituição da República, o Tribunal decide pronunciar- -se pela inconstitucionalidade da norma do n.º 2 do artigo 78.º do Decreto n.º 426/XII da Assembleia da República que “Aprova o Regime Jurídico do Sistema de Informações da República Portuguesa”, por violação do n.º 4 do artigo 34.º da CRP. Lisboa, 27 de agosto de 2015. – Lino Rodrigues Ribeiro – Fernando Vaz Ventura – Carlos Fernandes Cadi- lha – Ana Maria Guerra Martins – Maria Lúcia Amaral (com declaração) – José António Pires Teles Pereira (votei vencido, conforme declaração junta) – Joaquim de Sousa Ribeiro. DECLARAÇÃO DE VOTO Votei a decisão. Não subscrevo, no entanto, os fundamentos que a sustentaram e que foram sufragados pela maioria. 1. O juízo de inconstitucionalidade que o Tribunal faz, no presente caso, decorre de uma operação de interpretação constitucional que conduz ao seguinte resultado: em Portugal, diz-se, a CRP proíbe em qual- quer circunstância que os Serviços de Informação da República acedam aos dados de tráfego das telecomu- nicações privadas, uma vez que o direito fundamental à inviolabilidade destas últimas só pode ser restringido através da lei em matéria de processo criminal. De acordo, portanto, com esta interpretação, extra delictum – fora de um processo [criminal] já iniciado contra alguém em tribunal e para além das suas garantias – as autoridades públicas portuguesas não estarão pura e simplesmente autorizadas a intercetar dados de tráfego telecomunicacional, quaisquer que sejam os fundamentos constitucionais que sustentem a necessidade da interceção ou qualquer que seja o valor comunitário pela mesma prosseguido. A razão de ser desta interpretação reside na redação literal do n.º 4 do artigo 34.º da CRP, particular- mente no seu inciso final. Por causa deste inciso, deve entender-se (diz ainda o Tribunal) que, ocorrendo in casu uma «tensão» ou «colisão» entre dois valores constitucionais de primeiríssima grandeza – a liberdade individual, por um lado, expressa no direito à inviolabilidade das telecomunicações, e, por outro, a segurança e preservação da própria ordem constitucional, expressa na necessidade de prevenir a ocorrência de atos que contra ela atentem –, a resposta à questão de saber em que termos é que essa «tensão» ou «colisão» deve ser constitucionalmente resolvida não é tarefa que caiba ao intérprete empreender, uma vez que foi o próprio legislador constituinte que conferiu para ela uma solução clara. E essa é a da «reserva absoluta» do processo criminal, porque assim o determina a parte final do n.º 4 do artigo 34.º da CRP. Nestes termos, e a menos que haja uma revisão constitucional contendo para tanto uma explícita autorização, os Serviços de Informa- ções da República, que se situam claramente fora do âmbito do poder judicial e que atuam por outros meios que não os próprios de um processo que corra em juízo, não podem, em caso algum, intercetar os chamados dados de tráfego.

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