TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

76 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Ora, o Decreto n.º 426/XII nada menciona no que toca à forma de comunicação dos dados, nem remete esta matéria para qualquer outra regulamentação. E quanto ao tempo durante o qual é permitido o acesso aos dados, verifica-se a mesma falta de segurança jurídica. Nos termos do artigo 37.º, n.º 2, alínea d) , do Decreto, o prazo de acesso não pode exceder três meses, mas pode ser estendido, mediante autorização expressa. Porém, a lei não contém qualquer limite para tal prorrogação, nem estabelece em que condições pode ser autorizada a referida prorrogação. A lei prevê assim, a partir do momento em que a Comissão de Controlo Prévio dá a sua autorização, uma possibilidade de acesso aos dados de tráfego sem qualquer limite máximo de tempo. Assim, tal como decidiu o TEDH no caso Valenzuela c. Espanha, acima referido, a falta de menção de prazo específico de duração da medida gera incerteza para os destinatários da mesma, pelo que não se pode considerar, também por aqui, que a lei cumpra a exigência de determinabilidade. Idêntica incerteza pode apontar-se no que respeita à eliminação dos dados – que corresponderia, aliás, a uma exigência do direito à autodeterminação comunicativa, na vertente do “direito ao esquecimento”. No Decreto n.º 426/XII não se especifica qualquer prazo para a manutenção ou eliminação obrigatória dos dados. De resto, são escassas e incertas as possibilidades previstas referentes à eliminação dos dados. O artigo 37.º, n.º 8, prevê a possibilidade da Comissão de Controlo Prévio, em coletivo, participar à Comissão de Fis- calização «os elementos conducentes à destruição imediata desses dados ou informações». Todavia, sem a pre- visão legal de um acompanhamento constante por essa Comissão, fica por saber como chega ao seu conhe- cimento a existência de dados que devem ser eliminados. Por seu turno, o Secretário-Geral tem poderes para ordenar a destruição imediata de todos os dados e informações recolhidos mediante a autorização prevista no presente artigo, «sempre que não tenham relação com o objeto ou finalidades da mesma» (artigo 37.º, n.º 7). Assim, na prática, a fiscalização da manutenção de dados é apenas levada a cabo pela Comissão de Fiscalização do SIRP que, em regra, exerce a sua atividade fiscalizadora dos centros de dados por amostragem (artigo 30.º, n.º 1). A única norma que se refere a um “dever” de eliminação de dados consta do artigo 30.º, n.º 3, de acordo com a qual a referida Comissão de Fiscalização «deve ordenar o cancelamento ou retificação de dados recolhidos que envolvam violação dos direitos, liberdades e garantias consignados na Constituição e na lei». Não se estipula, porém, em que condições ou em que prazos tem lugar uma fiscalização conducente a esta avaliação e correspondente destruição dos dados. No mais, qualquer possibilidade de eliminação ou destruição de dados estará sempre dependente do conhecimento e pedido dos visados, nos termos do artigo 32.º. Ora, a falta de prazos perentórios de eliminação de dados, ou de procedimentos periódicos obrigatórios destinados a averiguar a necessidade de manutenção de todos os dados existentes, bem como de clara deter- minação do momento ou condições em que a manutenção dos dados deixa de ser necessária, também não oferece suficiente segurança à defesa dos direitos e interesses dos cidadãos. 24. De todo o exposto resulta, assim, que, independentemente da natureza específica do órgão “Comis- são de Controlo Prévio”, a atuação do mesmo não se afigura equiparável ao controlo jurisdicional existente em processo penal em matéria de direitos fundamentais. De facto, este último, no que toca à ingerência nas comunicações, assegura garantias não só no que respeita ao acesso, mas ainda no que toca ao tratamento, manutenção e destruição ou cancelamento dos dados, definindo inclusivamente prazos máximos perentórios para o efeito. Neste contexto, vigoram as garantias do Código de Processo Penal e da Lei n.º 32/2008 que estabelece várias garantias no que toca ao tratamento e conservação de todos esses dados, sendo nota comum a todo o acesso, tratamento, conservação e extinção, a intervenção de um juiz (cfr. artigos 7.º, 9.º e 11.º). Esta intensidade de controlo não é levada a cabo pela referida Comissão de Controlo Prévio, que se limita a conceder um «visto» prévio de autorização, após o que não exerce qualquer acompanhamento durante as atividades de acesso aos dados em causa. Neste ponto se vê, pois, também que a institucionalização do con- trolo prévio mencionado em nada se pode considerar equiparável ao oferecido em matéria de processo penal. Enfim, importa reconhecer que a ingerência nos dados de comunicação não tem, no presente con- texto, lugar num procedimento que dê garantias e faculdades de proteção de alcance assimilável àquelas que

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