TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
67 acórdão n.º 403/15 Enquanto no caso do artigo 34.º, n.º 4, a lei se limita a declarar a restrição prevista na Constituição, tendo de se conformar com o condicionalismo que se encontra expressamente recortado no preceito cons- titucional, nos outros casos, em que não existe uma tal especificação, a lei cria a restrição admitida pela Constituição tendo, no entanto, de sujeitar-se aos requisitos de legitimidade impostos pelo princípio da pro- porcionalidade, como decorre do artigo 18.º, n.º 2, segunda parte. Tornando-se a todos os títulos claro, neste contexto, que o grau de vinculação do legislador é maior quando a restrição está, desde logo, expressamente prevista na norma constitucional (neste sentido, Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit. , Vol, I, p. 391). E não é de menor importância a fixação dos termos da autorização constitucional para a restrição, já que através deles se conhece também o âmbito de proteção da norma constitucional consagradora daquele direito fundamental. É que, como refere Gomes Canotilho, a norma constitucional que consagra um direito sujeito a reserva de lei restritiva, para além de autorizar o legislador a estabelecer limites ao âmbito de prote- ção constitucionalmente garantido (norma de autorização de restrição), é simultaneamente uma norma que reconhece e garante um determinado âmbito de proteção ao direito fundamental (norma de garantia) – cfr. ob. cit, p. 1260. De modo que a enunciação constitucional expressa da matéria em que há autorização para uma inter- venção legislativa limitadora do âmbito de proteção do direito à inviolabilidade das comunicações constitui também uma garantia de que tais restrições não estão autorizadas noutras matérias e para outras finalidades. O poder de restrição do legislador encontra-se assim vinculado aos pressupostos e fins pré-determinados na norma constitucional que autoriza a restrição. Nesse sentido, refere Vieira de Andrade que «o próprio preceito constitucional que autoriza a restrição pode indicar expressamente os fins ou outros pressupostos específicos da restrição. Será o caso, por exemplo, dos artigos 27.º, n.º 3, 34.º, n.º 4, e 47.º, n.º 1, que podem ser consi- derados de “reserva qualificada”. Nestas situações, presume-se que o legislador só está autorizado a restringir o conteúdo dos direitos para essas finalidades, ou seja, para a salvaguarda dos direitos ou valores enunciados, quando muito para outras finalidades que decorram necessariamente ou se possam considerar implicadas nas expressamente referidas» (cfr. Direitos Fundamentais na Constituição de 1976, 5.ª edição, p. 281). 17. Ao definir o campo de incidência da lei restritiva do direito à inviolabilidade das comunicações pela “matéria de processo criminal” a Constituição ponderou e tomou posição (em parte) sobre o conflito entre os bens jurídicos protegidos por aquele direito fundamental e os valores comunitários, especialmente os da segurança, a cuja realização se dirige o processo penal. Não obstante as restrições legais ao direito à inviola- bilidade das comunicações que o legislador está autorizado a estabelecer deverem obedecer à ponderação do princípio da proporcionalidade, a preferência abstrata pelo valor da segurança em prejuízo da privacidade das comunicações só pode valer em matéria de processo penal. É que a não inclusão de outras matérias do âmbito da restrição do direito à inviolabilidade das comunicações, não é contrária ao plano ordenador do sistema jurídico-constitucional. Ainda que se pudesse considerar, em abstrato, que há outras matérias em que o valor da segurança sobreleva os valores próprios do direito à inviolabilidade das comunicações, a falta de cobertura normativa da restrição em matérias extraprocessuais não frustra as intenções ordenadoras do atual sistema, porque há razões político-jurídicas que estão na base da abstenção do legislador constitucional. Que não estamos perante uma “incompletude contrária ao plano normativo” da Constituição é con- firmado, de forma implícita, mas clara, pelas opções valorativas tomadas aquando da 4.ª e da 5.ª revisões constitucionais. Nessas revisões foram abertamente tidos em conta imperativos acrescidos de segurança e a necessidade de incrementar medidas contra a criminalidade referida na alínea c) do n.º 2 do artigo 4.º do Decreto n.º 426/XII. Esse objetivo levou a alterações que se traduziram em restrições a direitos fundamen- tais, nesta área, com a consagração de novos equilíbrios normativos entre os valores aqui em confronto. Assim, pela 4.ª revisão, o artigo 33.º, n.º 3, passou a prever a extradição de cidadãos portugueses, em condições de reciprocidade estabelecidas em convenção internacional, nos casos de terrorismo e de crimina- lidade internacional organizada, e desde que a ordem jurídica do Estado requisitante consagre garantias de
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