TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
515 acórdão n.º 392/15 Dias, Coimbra Editora, 2003, pp. 1315-1363; Jorge Dias Duarte, «Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro – Breve comentário aos novos regimes de segredo profissional e de perda de bens a favor do Estado», in Revista do Ministério Público , Ano 23, janeiro/março 2002, n.º 89, pp. 141-154; José M. Damião da Cunha, «Perda de bens a favor do Estado», in Medidas de Combate à Criminalidade Organizada e Económico-Financeira, CEJ, Coimbra Editora, 2004, pp. 121-164; Pedro Caeiro, «Sentido e função do instituto da perda de vantagens relacionadas com o crime no confronto com outros meios de prevenção da criminalidade reditícia (em especial, os procedimentos de confisco in rem e a criminalização do enriquecimento “ilícito”)», in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 21, N.º 2, Abril-Junho 2011, pp. 267-321). Este propósito do legisla- dor encontra-se expressamente assumido na exposição de motivos constante da Proposta de Lei n.º 94/VIII (que esteve na origem da referida Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro), onde se refere, a esse respeito, que «(…) a eficácia dos mecanismos repressivos será insuficiente se, havendo uma condenação criminal por um destes crimes [identificados no artigo 1.º], o condenado puder, ainda assim, conservar, no todo ou em parte, os proventos acumulados no decurso de uma carreira criminosa. Ora, o que pode acontecer é que, tratando-se de uma atividade continuada, não se prove no processo a conexão entre os factos criminosos e a totalidade dos respetivos proventos, criando-se, assim, uma situação em que as fortunas de origem ilícita continuam nas mãos dos criminosos, não sendo estes atingidos naquilo que constituiu, por um lado, o móbil do crime, e que pode constituir, por outro, o meio de retomar essa atividade criminosa», acrescentando-se ainda que, com este regime, se prevê que «(…) em caso de condenação por um dos crimes previstos no seu artigo 1.º, se aprecia a congruência entre o património do arguido e os seus rendimentos lícitos. O valor do património do arguido que seja excessivo em relação aos seus rendimentos cuja licitude fique provada no processo são declarados perdidos em favor do Estado». No entanto, embora não se exija a prova da conexão entre o ilícito criminal e os respetivos proventos, o regime da perda de vantagens da atividade criminosa exige que se mostrem verificados alguns requisitos, conforme decorre, designadamente, dos artigos 7.º e 9.º da Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro. Assim, em primeiro lugar, terá de haver condenação por um dos crimes previstos no artigo 1.º da refe- rida Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro (tráfico de estupefacientes, terrorismo e organização terrorista, tráfico de armas, tráfico de influência, corrupção ativa e passiva, peculato, participação económica em negócio, branqueamento de capitais, associação criminosa, contrabando, tráfico e viciação de veículos furtados, leno- cínio e lenocínio de menores, tráfico de pessoas, contrafação de moeda e de títulos equiparados a moeda). Para além disso, terá de existir uma diferença entre o valor do património do arguido [integrado pelos bens enumerados nas alíneas a) a c) do n.º 2 do artigo 7.º] e aquele que seja congruente com o seu rendimento lícito. Existindo essa incongruência de valores, a lei presume que tal diferença constitui vantagem de uma atividade criminosa (sobre os requisitos necessários à aplicação desta medida, matéria sobre a qual não há unanimidade na doutrina, designadamente quanto à necessidade de demonstração da existência de uma atividade criminosa anterior, cfr. Augusto Silva Dias, ob. cit. , pp. 44 e segs.; João Conde Correia, ob. cit. , pp. 103 e segs.; José M. Damião da Cunha, ob. cit. , pp. 124 e segs.; Pedro Caeiro, ob. cit. , pp. 313 e segs.). Para além destes requisitos de natureza material, a Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro, fixa um conjunto de regras processuais a que deve obedecer este mecanismo de perda de vantagens da atividade criminosa. Desde logo, a referida discrepância entre o valor do património do arguido e aquele que seja congruente com o seu rendimento lícito terá de ser invocada pelo Ministério Público na acusação, em que deverá fazer a liquidação do montante apurado como devendo ser perdido a favor do Estado ou, não sendo possível a liqui- dação no momento da acusação, a mesma poderá ainda ter lugar até ao 30.º dia anterior à data designada para a realização da primeira audiência de discussão e julgamento (cfr. artigo 8.º, n. os 1 e 2, da Lei n.º 5/2002 de 11 de janeiro). Esta liquidação é notificada ao arguido e ao seu defensor (cfr. artigo 8.º, n.º 4, da Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro), podendo o arguido apresentar a sua defesa na contestação, se a liquidação tiver sido deduzida na acusação, ou no prazo de 20 dias a contar da notificação da liquidação, caso esta tenha sido posterior à acusação (cfr. artigo 9.º, n.º 4, da Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro).
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