TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
502 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Como é consabido e tem sido referido em variados arestos deste Tribunal, o cumprimento do dever de fundamentação das decisões judiciais pode assumir, conforme os casos, uma certa geometria variável, sendo entregue ao legislador ordinário a tarefa de definir as formas e o grau de fundamentação exigível. Relativamente às medidas de coação, com exceção do termo de identidade e residência, o artigo 194.º, n.º 6, do Código de Processo Penal, exige que a fundamentação do despacho que as aplique contenha, sob pena de nulidade: «(…) a) A descrição dos factos concretamente imputados ao arguido, incluindo, sempre que forem conhecidas, as circunstâncias de tempo, lugar e modo; b) A enunciação dos elementos do processo que indiciam os factos imputados, sempre que a sua comunicação não puser gravemente em causa a investigação, impossibilitar a descoberta da verdade ou criar perigo para a vida, a integridade física ou psíquica ou a liberdade dos participantes processuais ou das vítimas do crime; c) A qualificação jurídica dos factos imputados; d) A referência aos factos concretos que preenchem os pressupostos de aplicação da medida, incluindo os previstos nos artigos 193.º e 204.º». Constitucionalmente é exigível que na fundamentação seja visível uma racionalização dos motivos da decisão, revelando-se aos sujeitos processuais e à comunidade o conhecimento das razões que subjazem ao concreto juízo decisório, devendo, para isso, a fundamentação revelar uma aptidão comunicativa na exterio- rização das premissas que presidem à sua conclusão, assim como o respetivo juízo de valoração, de modo a transmitir, como condição de inteligibilidade, a intrínseca validade substancial do decidido. E numa decisão como a que decreta a prisão preventiva de uma pessoa, dado estar em causa a aplicação de uma medida que restringe de uma forma particularmente intensa o direito à liberdade do detido, a necessidade de observância daqueles requisitos faz-se sentir de uma forma mais intensa. Contudo, tais exigências não ficam materialmente prejudicadas quando uma decisão que decrete a prisão preventiva, perante uma pronúncia anterior fundamentada sobre a questão a decidir emitida por um dos intervenientes processuais, designadamente o Ministério Público, remeta para as razões aí invocadas, subscrevendo um juízo que se considera totalmente adequado. Na verdade, nada impede que o resultado de uma avaliação crítica efetuada com total autonomia pelo julgador acabe por conduzir ao acolhimento integral dos argumentos explicitados previamente pelo Ministério Público, remetendo-se a fundamentação da decisão, por economia de meios, para aquela pronúncia, o que não deixa de permitir aos interessados e à comunidade o cabal conhecimento das razões determinantes do que se decidiu. Elas são as que foram avan- çadas pelo Ministério Público na sua promoção e que o juiz acolheu e declarou fazê-las suas, constituindo uma fundamentação cognoscível da decisão tomada. E se é verdade que, estando em causa a aplicação de uma medida que restringe severamente o direito à liberdade, as exigências de explicitação da fundamentação são maiores, também é verdade que a necessi- dade dessa decisão ser proferida imediatamente ao termo do interrogatório do arguido e após audição dos intervenientes processuais, sem demoras nem hiatos que acarretem uma dilação desrazoável da decisão (vide Acórdão n.º 135/05, deste Tribunal, acessível em www.tribunalconstitucional.pt ) , justifica que se recorra a técnicas de fundamentação que privilegiem uma economia de meios. Por estas razões é de manter a jurisprudência deste Tribunal no sentido de que não viola qualquer parâ- metro constitucional, designadamente o princípio da reserva de juiz e o dever de fundamentação das decisões judiciais, a norma constante do artigo 97.º, n.º 5, do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual a fundamentação da decisão que decreta a medida de prisão preventiva, pode ser feita por remissão para a promoção do Ministério Público, assim improcedendo este fundamento do recurso.
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