TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
493 acórdão n.º 391/15 O recorrente após colocar esta questão, por precaução de patrocínio, autonomizou as duas dimensões normativas que estavam incluídas nesta fórmula, enunciando-as separadamente nas duas questões seguida- mente enunciadas nos pontos 10) e 11). Efetivamente a questão de constitucionalidade colocada no ponto 9) continha duas dimensões norma- tivas distintas: uma relativa à admissibilidade da utilização de adágios populares e à sabedoria popular do homem médio na formação da livre convicção do julgador em processo penal, e outra relativa à admissibili- dade da utilização de presunções na formação dessa mesma convicção. Uma vez que o recorrente, por sua iniciativa, pediu, em alternativa, a apreciação separada destas duas dimensões, o que se entende preferível, atenta a sua autonomia, fica prejudicado o conhecimento, em globo, desta questão, sendo aquelas duas dimensões apreciadas na análise das questões colocadas nos pontos 10) e 11). 1.4.7. Da questão 10) O recorrente pretende que o tribunal fiscalize a constitucionalidade do artigo 127.º do Código de Pro- cesso Penal, na interpretação de que a apreciação da prova segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador permite o recurso a adágios populares e à sabedoria popular do homem médio. O recorrente alega que a sustentação desta interpretação se encontra subentendida na decisão recorrida, uma vez que esta, no seu entender, recorre a aforismos populares para daí considerar suficientemente indi- ciada a prática de determinados crimes. Se é verdade que a fundamentação do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa em 17 de março de 2015 faz referência a adágios e expressões populares, tais como “quem cabritos vende e cabras não tem, de algum lado lhe vêm”, ou “gato escondido com rabo de fora”, não resulta do discurso argumentativo que esses aforismos tenham funcionado como fator de convicção no apuramento da existência de indícios fortes da prática de crimes, sendo apenas utilizados pelos subscritores da decisão como figuras de estilo ilus- trativas dos raciocínios desenvolvidos na demonstração da existência daqueles indícios. Aliás, no acórdão de 28 de abril de 2015 do Tribunal da Relação de Lisboa nega-se expressamente um papel fundamentador a tais expressões, referindo-se que “é por demais evidente que não foram tais aforismos o centro e o núcleo da fundamentação, mas elementos concludentes da plasticidade e transparência do dis- curso judiciário utilizado”. Por esta razão não é possível concluir que o tribunal recorrido, quando verificou nas provas que lhe foram apresentadas a existência de indícios fortes da prática pelo arguido de ilícitos criminais tenha impli- citamente adotado o critério segundo o qual a apreciação da prova segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador permite o recurso a adágios populares e à sabedoria popular do homem médio. Não tendo a interpretação normativa cuja constitucionalidade o recorrente pretende ver fiscalizada integrado a ratio decidendi dos acórdãos recorridos e não tendo o Tribunal Constitucional competência para efetuar uma censura à utilização de tal tipo de expressões no discurso judiciário, não é possível conhecer desta questão de constitucionalidade, atenta a natureza instrumental do recurso para o Tribunal Constitucional. 1.4.8. Da questão 12) O recorrente pretende que o Tribunal Constitucional fiscalize a constitucionalidade do artigo 127.º do Código de Processo Penal, na interpretação de que a fundamentação da livre convicção do Tribunal e a invocação das regras de experiencia se podem reconduzir em processo penal, para efeito de julgar verificados os fortes indícios a que se refere o artigo 202.º, n.º 1, à invocação de aforismos e expressões como “amizade sem limites”, “estilo de vida luxuoso”, “sólidas fontes de rendimento”, “quem cabritos vende cabras não tem, de algum lado lhe vêm”, “milagre de altruísmo”, “gato escondido com rabo de fora” e a argumentos como “a franja de prova”, “regras de presunção lícitas aceitáveis”, “ser altamente provável” a existência de indícios, “a prova de factos (…) resultar de outros factos que não se comprovam em si próprios, mas de ilações, retiradas
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