TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
484 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 16 – No ponto 4, vem levantada a questão da constitucionalidade da norma do artigo 97.º n.º 4, do CPP, na interpretação segundo a qual a fundamentação dos atos decisórios do juiz, quando disponham sobre matérias atinentes aos direitos fundamentais, designadamente quanto à indiciação e às medidas de coação privativas da liberdade, pode ser feita por remissão para a promoção do Ministério Público – inconstitucionalidade por violação da reserva de juiz e do dever de fundamentar, garantidos pelos artigos 32.º, n.º 4, e 205.º, n.º 1, da Constituição. 17 – O Tribunal Constitucional, numa jurisprudência uniforme, tem entendido que não viola o dever de fun- damentação constitucionalmente consagrada (artigo 205.º, n.º 1 da Constituição), a possibilidade de o despacho que determinou a prisão preventiva ser fundamentado por remissão para a promoção do Ministério Público. 18 – Não inconstitucionalidade que na situação dos autos é ainda mais evidente porque a promoção do Minis- tério Público mostrava-se pormenorizada e desenvolvida e a remissão – apenas em parte – não foi por mera adesão e acrítica, ficando assim criadas todas as condições para que o recorrente pudesse impugnar amplamente a decisão, como viria a fazer, de forma exaustiva, na motivação do recurso interposto para a Relação. 19 – Assim, nesta parte, deve negar-se provimento ao recurso.» II – Fundamentação 1. Da delimitação do objeto do recurso 1.1. Dos pressupostos do recurso de constitucionalidade No sistema português de fiscalização de constitucionalidade, a competência atribuída ao Tribunal Cons- titucional cinge-se ao controlo da inconstitucionalidade normativa, ou seja, das questões de desconformi- dade constitucional imputada a normas jurídicas ou a interpretações normativas, e já não das questões de inconstitucionalidade imputadas diretamente a decisões judiciais, em si mesmas consideradas. A distinção entre os casos em que a inconstitucionalidade é imputada a interpretação normativa daqueles em que é imputada diretamente a decisão judicial radica em que na primeira hipótese é discernível na decisão recorrida a adoção de um critério normativo, ao qual depois se subsume o caso concreto em apreço, com carácter de generalidade, e, por isso, suscetível de aplicação a outras situações, enquanto na segunda hipótese está em causa a aplicação dos critérios normativos tidos por relevantes às particularidades do caso concreto. Nos recursos interpostos ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC – como ocorre no pre- sente processo –, a sua admissibilidade depende ainda da verificação cumulativa dos requisitos de a questão de inconstitucionalidade haver sido suscitada «durante o processo», «de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» (n.º 2 do artigo 72.º da LTC), e de a decisão recorrida ter feito aplicação, como sua ratio decidendi , das dimensões normativas arguidas de inconstitucionais pelo recorrente. Consistindo a competência do Tribunal Constitucional, no domínio da fiscalização concreta, na facul- dade de revisão, em via de recurso, de decisões judiciais, compreende-se que a questão de constitucionalidade deva, em princípio, ter sido colocada ao tribunal a quo, além de que permitir o acesso a este Tribunal com base numa invocação da inconstitucionalidade unicamente após a prolação da decisão recorrida, abriria o indesejável caminho à sua utilização como expediente dilatório. Daí que só tenha legitimidade para pedir ao Tribunal Constitucional a fiscalização de constitucionalidade de uma norma quem tenha suscitado previa- mente essa questão ao tribunal recorrido, em termos de o vincular à sua apreciação, face às normas procedi- mentais que regem o processo em que se enxerta o recurso constitucional. Contudo, este requisito (suscitação da questão de inconstitucionalidade perante o tribunal recorrido, antes de proferida a decisão impugnada) considera-se dispensável nas situações especiais em que, por força de uma norma legal específica, o poder jurisdicional se não esgota com a prolação da decisão recorrida, ou naquelas situações, de todo excecionais ou anómalas, em que o recorrente não dispôs de oportunidade
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