TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

472 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL  O caráter restritivo da utilização desse meio de prova é também evidenciado pelo regime procedimental que lhe é aplicável e que expressamente decorre do transcrito artigo 188.º» Transposta esta jurisprudência para o caso ora em apreço, retira-se que o legislador consagrou já um conjunto de requisitos formais e materiais para a admissibilidade de escutas telefónicas, concretamente nos artigos 187.º a 189.º do CPP, de forma a construir um sistema de escutas telefónicas admissível à luz da CRP. Decorre, pois, das várias normas contidas nos preceitos mencionados, entre outros aspetos, que as escutas telefónicas têm de ser autorizadas por uma autoridade judiciária, a quem cabe avaliar a sua proporcionali- dade – isto é, a sua adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido escrito –, de molde a garantir a menor intervenção possível nos direitos fundamentais restringidos. Nesse preciso sentido, nos termos do artigo 190.º do CPP, “[o]s requisitos e condições referidos nos artigos 187.º, 188.º e 189.º são estabelecidos sob pena de nulidade”. Ora, não obstante um suspeito, por não chegar a ser constituído arguido, não ter à partida a possibi- lidade de recorrer das escutas telefónicas existentes num certo processo, não significa isto que tal possibili- dade lhe seja cerceada num eventual segundo processo que tenha a sua origem numa certidão de escutas do primeiro processo. Por outras palavras: caso a certidão de escutas relativa ao primeiro processo enferme de algum problema de validade que possa vir a afetar as escutas telefónicas emitidas num novo processo, não se vislumbra qualquer impedimento legal a que um determinado arguido possa atacar a legalidade das escutas com base nesse argumento. Da jurisprudência citada parece possível inferir que, desde que respeitados os vários requisitos formais e materiais de admissibilidade das escutas telefónicas, quer no processo de origem quer no processo aqui em causa, estas podem, à partida, ser utilizadas noutros processos de inquérito para os quais tenham relevo. E, além disso, é ainda legítimo o recurso a escutas telefónicas mesmo que como primeiro meio de obtenção da prova, desde que o juiz competente demonstre que a sua utilização é indispensável – rectius , adequada, necessária e proporcional em sentido estrito – para a descoberta da verdade ou para a prova.  Na verdade, resulta dos autos em apreço que o recorrente teve à sua disposição todos os meios de defesa necessários para poder invalidar a utilização das escutas telefónicas que foram utilizadas em concreto. Se não o fez, foi porque decidiu não o fazer e não porque não tenha tido hipótese legal de o fazer.   Por outro lado, também resulta dos autos que as escutas eram “o único meio eficaz para a descoberta da verdade e para a prova, conforme ponderação judicial tempestivamente efetuada e espelhada nos correspon- dentes despachos de autorização (…)”.  Em suma, em face do exposto, temos de concluir pela não inconstitucionalidade da interpretação nor- mativa ora em apreciação, uma vez que existe a possibilidade de atacar a legalidade das escutas telefónicas no novo processo. Ou seja, tal não põe em causa as garantias de defesa (artigo 32.º, n.º 1, da CRP) nem a presunção da inocência do arguido, até ao trânsito em julgado da sentença de condenação (artigo 32.º, n.º 2, da CRP). III – Decisão Em face do exposto, decide-se: a) Não julgar inconstitucional a norma retirada do artigo 187.°, n.° 1, do CPP, com o sentido de que o juiz de instrução criminal pode autorizar escutas telefónicas a um suspeito, quando, nesse pro- cesso, não exista mais do que uma certidão de escutas de outro processo, em que o suspeito não foi constituído arguido; E, em consequência: b) Não conceder provimento ao recurso.

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