TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
467 acórdão n.º 381/15 «(…) Em conclusão I A questão suscitada é a da inconstitucionalidade do artigo 187.º, n.º 1 do C.P.P., por violação dos artigos 2.º, 18.º, 32.º, n.º 1, 2 e 8 e 34.º da Constituição da República Portuguesa, interpretado no sentido de que o Juiz de Instrução Criminal pode autorizar as escutas telefónicas ao número de telemóvel de um suspeito quando, no referido processo, consta apenas uma certidão com escutas telefónicas retiradas doutro processo em que o suspeito nunca foi constituído arguido, não existindo qualquer outro elemento.” II Ou seja, no presente caso concreto verifica-se que o recorrente, e outros suspeitos foram investigados no âmbito do processo n.º 95/11.1SMLSB, pela 1.ª Secção do DIAP de Lisboa, durante quase 2 (dois) anos pela prática de crime de tráfico de estupefacientes; III Concluídas as investigações naquele processo, sem que o recorrente alguma vez tivesse sido constituído arguido, daqueles autos logo foi extraída uma certidão de escutas telefónicas efetuadas ao recorrente, e com base unicamente nesse elemento, foi aberto um novo processo; IV A referida certidão, que originou os presentes autos, é composta, unicamente, por autos de transcrição de escutas telefónicas efetuadas ao recorrente e nada mais do que isso; V Sem que fosse efetuada qualquer diligência de prova, com base unicamente numa certidão de escutas telefóni- cas ao recorrente, logo foram solicitadas mais escutas telefónicas, sem que fosse sequer fundamentada a impossibi- lidade de obtenção de prova por outro meio; VI Ou seja, o Senhor Juiz de instrução Criminal, bem sabendo, ou tendo obrigação de saber, que o arguido tinha sido investigado num processo onde não foram recolhidos quaisquer elementos que permitissem que, nesse pro- cesso o recorrente fosse sequer constituído arguido, sem qualquer grau de exigência, permitiu que os seus direitos mais elementares continuassem a ser violados indefinidamente; VII Nos presentes autos as escutas telefónicas não foram utilizadas como ultima ratio mas sim como prima ratio , sendo violado de forma flagrante o artigo 187.º do CPP e bem assim, nomeadamente o artigo 34.º da CRP VIII Ao consagrar que “Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana (…)” a Cons- tituição vincula todo e qualquer cidadão a respeitar o outro como pessoa humana dotada de dignidade, princípio diretamente aplicável quer a entes públicos quer a entes privados. E, em consequência, a prova não é um valor absoluto e ilimitado, pois cede face aos direitos fundamentais, principalmente aos que personalizam o homem. IX Num regime democrático e submetido ao valor da lealdade, os fins não podem justificar os meios, pelo que o artigo 32.º, n.º 8 da CRP, cuja expressão processual está materializada nos artigos 126.º e, no plano das escutas telefónicas, no artigo 189.º da CRP, proíbe as provas obtidas com ofensa dos direitos fundamentais.
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