TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
458 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Constituição”, não fazendo sentido “aceitar que os mesmos não tenham projeção na fase recursória posterior, que corresponde à jurisdicionalização daquele processo”, tendo concluído pela inconstitucionalidade da “norma do artigo 416.º do CPP aplicada ao processo de contraordenação laboral e aí interpretada em termos de não impor a notificação à arguida do parecer do Ministério Público em que se suscita, pela primeira vez, a questão prévia do não recebimento do recurso por extemporaneidade”. Uma outra situação de “extensão” ao processo contraordena- cional de garantias do processo criminal foi contemplada no Acórdão n.º 265/01, que, na sequência dos Acórdãos n. os 319/99, 509/00 e 590/00, declarou a inconstitucionalidade das disposições conjugadas constantes do n.º 3 do artigo 59.º e do n.º 1 do artigo 63.º, ambos do RGCO, “na dimensão interpretativa segundo a qual a falta de formulação de conclusões na motivação de recurso, por via do qual se intenta impugnar a decisão da autoridade administrativa que aplicou uma coima, implica a rejeição do recurso, sem que o recorrente seja previamente con- vidado a efetuar tal formulação”. 2.4. Assente que, dada a diferente natureza dos ilícitos em causa e a menor ressonância ética do ilícito de mera ordenação social, com reflexos nos regimes processuais próprios de cada um deles, não é constitucionalmente imposto ao legislador a equiparação das garantias em ambos esses regimes, é evidente que não se pode considerar inconstitucional a não admissibilidade de recurso jurisdicional de decisões proferidas em sede de impugnação judicial de decisões administrativas aplicadoras de coimas quando nem sequer relativamente às correspondentes decisões no âmbito do processo criminal idêntica garantia é exigida.». Importa pois, no sentido de saber até que ponto existirá uma imposição constitucional de proibição de reformatio in pejus em situações como a dos autos, ter em atenção o modo como está estruturado o processo de contraordenação, desde logo para apurar se os fundamentos constitucionais em que assenta a referida proibição no que respeita ao processo criminal são extensíveis ao tipo de processo contraordenacional em causa nos autos. Como é sabido, no caso do processo de contraordenação, impugnada a decisão administrativa que apli- cou uma sanção e caso a autoridade administrativa não revogue a decisão de aplicação da coima (cfr. artigo 62.º, n.º 2, do Regime Geral das Contraordenações), os autos são enviados ao Ministério Público, que os tornará presentes ao juiz, valendo este ato como acusação (cfr. n.º 1 do referido artigo 62.º). Assim, quando recebe os autos, o Ministério Público passa a assumir o papel de titular do processo, podendo, para além de os apresentar ao juiz, nos termos referidos, optar por retirar a acusação, desde que se verifiquem os pressu- postos formais do artigo 65.º-A do Regime Geral das Contraordenações, podendo, ainda, inclusive, requerer a conversão do processo em processo criminal, nos termos previstos no artigo 76.º do aludido regime (o que determinará a instauração de inquérito). Por outro lado, mesmo depois de o processo ser remetido ao tribu- nal, o arguido poderá também retirar o recurso, até à sentença em primeira instância ou até ser proferido o despacho previsto no artigo 64.º, n.º 2, sendo que, se o fizer depois do início da audiência carece do acordo do Ministério Público (cfr. artigo 71.º). Conforme se pode constatar, não existe paralelismo entre o processo criminal e o processo contraorde- nacional, não se podendo equiparar o recurso para um tribunal superior no âmbito de um processo criminal interposto pelo arguido ou no interesse deste e a impugnação da decisão administrativa que aplica uma san- ção no âmbito de um processo contraordenacional para um tribunal. Neste último caso, remetidos os autos ao tribunal, o Ministério Público passa a ser, nos termos expostos, o titular da pretensão punitiva e, optando por remetê-los ao juiz, não se poderá dizer que se tenha conformado com a decisão administrativa, contra- riamente ao que acontece na situação prevista no artigo 409.º do Código de Processo Penal. Assim, tendo em atenção que a admissibilidade da reformatio in pejus na questão de constitucionali- dade em análise se reporta à impugnação judicial de decisão administrativa, o direito de defesa que poderá revelar-se ameaçado com tal solução não é o direito ao recurso dentro da hierarquia jurisdicional, mas sim o direito de acesso aos tribunais, ou seja a garantia de tutela jurisdicional efetiva, pelo que o que importa verificar é se a interpretação normativa questionada viola o disposto no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição, e
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