TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

457 acórdão n.º 373/15 Constitui afirmação recorrente na jurisprudência do Tribunal Constitucional a da não aplicabilidade direta e global aos processos contraordenacionais dos princípios constitucionais próprios do processo criminal, desde logo o princípio da judicialização da instrução consagrado no n.º 4 do artigo 32.º (neste sentido: Acórdão n.º 158/92). A diferença de “princípios jurídicoconstitucionais, materiais e orgânicos, a que se submetem entre nós a legislação penal e a legislação das contraordenações” reflete-se “no regime processual próprio de cada um desses ilícitos”, não exigindo “um automático paralelismo com os institutos e regimes próprios do processo penal, inscrevendose assim no âmbito da liberdade de conformação legislativa própria do legislador”, por exemplo, a não atribuição ao assistente (admitindo que a lei consente em processo contraordenacional esta figura) de legitimidade para recorrer, legitimidade que o artigo 73.º, n.º 2, do RGCO apenas reconhece ao arguido e ao Ministério Público (Acórdão n.º 344/93). Assentando na liberdade de conformação do legislador ordinário, ao qual não é constitucionalmente imposta a equiparação de garantias do processo criminal e do processo contraordenacional, o Acórdão n.º 50/99 não julgou inconstitucional a norma da parte final do artigo 66.º do RGCO, que afasta a redução a escrito da prova produzida na audiência em 1.ª instância. Ainda como exemplos da admissibilidade constitucional da dife- renciação de regimes podem citar-se: (i) os Acórdãos n. os 473/01 e 395/02, que não julgaram inconstitucionais os artigos 59.º, n.º 3, e 60.º, n. os 1 e 2, do RGCO, na interpretação de que o prazo para a interposição do recurso da decisão da autoridade administrativa neles previsto não se suspende durante as férias judiciais; (ii) os Acórdãos n. os 50/03, 62/03, 249/03, 469/03 e 492/03, que consideraram não constitucionalmente imposta a transposição para a fundamentação da decisão administrativa sancionatórias das mesmas exigências que o artigo 374.º do CPP esta- belece para a sentença penal condenatória, e, consequentemente, não julgaram inconstitucional a norma do artigo 125.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, interpretada no sentido de que a fundamentação por remissão nela consentida é aplicável à decisão sancionatória de ato ilícito de mera ordenação social; (iii) o Acórdão n.º 581/04, que, considerando, além do mais, que “a garantia constitucional dos direitos de audiência e de defesa em processo contraordenacional (n.º 10 do artigo 32.º da Constituição) não pode comportar a consagração de um princípio da estrutura acusatória do processo idêntico ao que a Constituição reserva, no n.º 5 do artigo 32.º, para o «processo criminal»”, não julgou inconstitucionais os artigos 39.º, n.º 1, e 40.º do CPP, 2.º do Regime Geral das Contra Ordenações Laborais (Lei n.º 166/99, de 4 de agosto) e 41.º do RGCO, quando interpretados no sentido da inaplicabilidade dos dois primeiros a casos em que o autor da decisão de um processo de contraordena- ção laboral confirmou, anteriormente, a auto de notícia levantado ao destinatário dessa decisão; e (iv) o Acórdão n.º 325/05, que considerou “não passível de censura constitucional que, no processo contraordenacional, e antes da sua passagem à fase jurisdicional, atenta a menor ressonância ética do ilícito contraordenacional face ao direito criminal, o legislador possa, no exercício da sua liberdade conformadora, subtrair das mais rigorosas exigências pre- vistas para o processo penal determinados procedimentos concretos, mais rigorosos e porventura inultrapassáveis, quer no domínio criminal, quer no domínio de uma fase procedimental jurisdicionalizada, procedimentos esse que se reflitam, no referido processo, numa menos ampla exigência de observação de específicos requisitos processuais, como, por exemplo, a análise concreta, na decisão aplicadora da coima, da «exceções» ou «questões prévias» sus- citadas pelo acoimando na sua defesa”, e, consequentemente, não julgou inconstitucionais as normas dos artigos 50.º e 58.º do RGCO, interpretados no sentido de não imporem à autoridade administrativa o dever de pronúncia sobre as nulidades invocadas na defesa do arguido em processo de contraordenação. No entanto, este Tribunal também tem sublinhado que a reconhecida inexigibilidade de estrita equiparação entre processo contraordenacional e processo criminal é conciliável com “a necessidade de serem observados deter- minados princípios comuns que o legislador contraordenacional será chamado a concretizar dentro de um poder de conformação mais aberto do que aquele que lhe caberá em matéria de processo penal” (Acórdãos n. os  469/97 e 278/99). No primeiro acórdão referido acrescentou-se que “porventura, um desses princípios, comuns a todos os processos sancionatórios, que mais constrições imporá ao legislador será, desde logo, por direta imposição constitucional, o da audiência e correlativa defesa do arguido, inseridos num desenvolvimento processual em que o princípio do contraditório deverá ser mantido, como forma de complementar a estrutura acusatória, que não dispositiva, da atuação dos poderes públicos”, sublinhando que esses princípios são “imediatamente aplicáveis (…) logo na fase administrativa do processo contraordenacional, por exigência do n.º 8 [hoje n.º 10] do artigo 32.º da

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