TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
453 acórdão n.º 373/15 administrativa condenatória, é inconstitucional, por violação dos preceitos constitucionais que consagram o direito à tutela jurisdicional efetiva (cfr. artigo 20.º da Constituição), restringindo de forma desproporcio- nada o exercício pelo arguido do direito de defesa (cfr. artigo 32.º, n.º 10, da Constituição), na modalidade de impugnação ou recurso das decisões condenatórias das autoridades administrativas (cfr. artigo 268.º, n.º 4, da Constituição), o que se afigura inadmissível em face do n.º 2 do artigo 18.º da Constituição. Mais sustenta a recorrente que a aludida norma viola o princípio da igualdade, nada justificando o afastamento da regra geral prevista no artigo 72.º-A do Regime Geral das Contraordenações. Antes de analisar a questão de constitucionalidade, importa proceder ao enquadramento da proibição da reformatio in pejus no plano infraconstitucional, quer no direito processual penal, quer no processo de contraordenação. No âmbito do processo penal, a proibição da reformatio in pejus encontra-se prevista no artigo 409.º do Código de Processo Penal, cujo n.º 1 dispõe que «[i]nterposto recurso de decisão final somente pelo arguido, pelo Ministério Público, no exclusivo interesse daquele, ou pelo arguido e pelo Ministério Público no exclusivo interesse do primeiro, o tribunal superior não pode modificar, na sua espécie ou medida, as sanções constantes da decisão recorrida, em prejuízo de qualquer dos arguidos, ainda que não recorrentes», acrescentando o n.º 2 que esta proibição «não se aplica à agravação da quantia fixada para cada dia de multa, se a situação económica e financeira do arguido tiver entretanto melhorado de forma sensível». Tem-se entendido que esta é uma medida protetora do direito de recurso em favor do arguido, visando evitar que neste tipo de impugnação o arguido possa ser punido com sanções mais graves, o que, a acontecer condicionaria de modo intolerável o exercício do direito ao recurso. Já no que respeita ao domínio do ilícito de mera ordenação social, o Regime Geral das Contraordena- ções, instituído pelo Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, não continha na sua redação inicial norma semelhante. Só com as alterações introduzidas ao aludido regime pelo Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de setembro, é que foi aditado o artigo 72.º-A que, sob a epígrafe «Proibição da reformatio in pejus », dispõe, no n.º 1 que «[i]mpugnada a decisão da autoridade administrativa ou interposto recurso da decisão judicial somente pelo arguido, ou no seu exclusivo interesse, não pode a sanção aplicada ser modificada em prejuízo de qualquer dos arguidos, ainda que não recorrentes», acrescentando o n.º 2 que «[o] disposto no número anterior não prejudica a possibilidade de agravamento do montante da coima, se a situação económica e financeira do arguido tiver entretanto melhorado de forma sensível». Referindo-se a esta opção legislativa, Paulo Pinto de Albuquerque considera que esta proibição de refor- matio in pejus «é “inconveniente”, “injustificável” e tem “efeitos perversos”, tais como aumenta o número de recursos independentemente da gravidade das sanções e torna os recursos economicamente compensadores sempre que estejam em causa sanções muito elevadas, por via do diferimento no tempo do respetivo paga- mento. […] Pior ainda: a regra da proibição da reformatio in pejus contraria a própria natureza “provisória” da decisão administrativa e, portanto, também, a natureza da impugnação judicial, que consubstancia uma verdadeira “transferência da questão do domínio da administração para o juiz”» (cfr., Comentário do Regime Geral das Contraordenações à luz da Constituição da República e da Convenção europeia dos Direitos do Homem , Universidade Católica Editora, 2011, pp. 294-295, onde o autor faz ainda uma síntese das diversas críticas apontadas pela doutrina a este regime, com referência a outros autores com idênticas posições). Também Alexandra Vilela (cfr., O Direito de Mera Ordenação Social , Coimbra Editora, 2013, p. 485) defende que não se justifica a proibição de reformatio in pejus , pelo menos nos casos em que a impugnação judicial seja decidida em audiência, referindo, a este respeito o seguinte: «[…] o princípio da proibição da reformatio in pejus não faz sentido quando o tribunal decide o recurso em audiência, pois, nesse momento, os autos já foram “examinados à lupa”, primeiro pela administração, segundo pelo MP e, em último lugar, pelo juiz. Assim sendo, se, apesar de tudo, prosseguiu sem que o MP e o arguido fizessem uso dos seus poderes de, respetivamente, retirar a acusação […] e de retirada do recurso […], de duas uma: ou o
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