TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
447 acórdão n.º 373/15 nos processos sancionatórios não se limitam a estes direitos de audição e defesa e reconhecido a existência de um evidente paralelismo entre o processo criminal e o processo contraordenacional, que é conformado por princípios básicos daquele, tendo em conta os interesses subjacentes. Tal ordem de considerações sai, evidentemente, reforçada quando o RGCOmanda aplicar ao respetivo processo, por via de direito subsidiário, a lei do processo criminal. X. É, ainda, entendimento sufragado pelo Tribunal Constitucional que os direitos e garantias do arguido em sede de processo contraordenacional não se esgotam, ou limitam ao referido n.º 10 do artigo 32.º da CRP, desenvolvendo-se e concretizando-se ao longo de outros; preceitos constitucionais, ou seja, o direito de impugnação perante os tribunais das decisões sancionatórias em causa, direito que se funda, em geral no artigo 20.º, n.º 1, e, especificamente para as decisões administrativas, no artigo 268.º, n.º 4, da CRP. XI. Donde, de todo o exposto, resulta desde logo fragilizada e difícil a conciliação e legitimação constitucional do afastamento da proibição de reformatio in pejus em sede de recurso de impugnação judicial de decisão administrativa sancionatória proferida no âmbito e ao abrigo do n.º 8 do artigo 416.º do CdvM. XII. Tendo este pano de fundo, cumpre acrescentar que se está perante um caso em que, se o arguido não interpu- ser recurso de impugnação judicial, a decisão condenatória da autoridade administrativa torna-se definitiva. Assim, bule com os princípios constitucionais que da interposição de recurso pelo arguido em sua defesa (no seu interesse) possa resultar um agravamento da sua situação de forma a surpreendê-lo. XIII. Deve, também, ser considerado para efeitos de apreciação deste recurso que é possível fundar constitucional- mente um direito genérico de recorrer das decisões jurisdicionais e que o legislador na sua concretização não pode abolir o sistema de recursos in toto ou afetá-lo substancialmente através da consagração de soluções que restrinjam de tal modo o direito de recorrer que, na prática, se traduzam na supressão tendencial dos recursos. XIV. Com efeito, as limitações ou restrições ao direito do recurso estão, por isso, sujeitas aos limites constitucionais gerais e, de modo especial, aos princípios da igualdade e da proporcionalidade, pelo que as diferenciações legais não podem ser arbitrárias e as medidas restritivas do direito de recorrer não devem ser excessivas. XV. Afigura-se, assim, evidente que a admissibilidade do afastamento de tal proibição (regime regra em sede de processo contraordenacional, tal como definido pelo RGCO) à luz da CRP sempre ficará, ao menos, condi- cionada a uma interpretação normativa, e consequente aplicação, do n.º 8 do artigo 416.º do CdVM confor- me os comandos constitucionais garantísticos do arguido, os quais não admitem restrições desproporcionadas e injustificadas. XVI. Assim, a interpretação normativa do preceito do n.º 8 do artigo 416.º do CdVM vertida na Decisão recorrida é vincadamente inconstitucional, consubstanciando uma restrição desproporcionada do direito de defesa (artigo 32.º, n.º 10 da CRP), na modalidade de direito ao recurso das decisões administrativas sancionatórias (artigo 268.º, n.º 4 da CRP) – corolários do direito de tutela jurisdicional efetiva (cfr. artigo 20.º, n.º 1 da CRP) –, em violação do disposto no n.º 2 do artigo 18.º da CRP. XVII. Com efeito, a interpretação normativa do artigo 416.º, n.º 8 do CdVM no sentido sufragado pela primeira instância e pela Relação é manifestamente inconstitucional, já que remete o arguido para uma situação de total desincentivo e, assim, completa desproteção jurisdicional, fruto de uma restrição desproporcionada do direito ao recurso jurisdicional, em violação do disposto no artigo 18.º da CRP em matéria de restrição de direitos, liberdades e garantias. XVIII. Quando nada se altera, a mera reavaliação subjetiva da situação existente (à data da condenação pela autori- dade administrativa e tal como ela existia) levada a cabo pela instância jurisdicional de controlo que culmina no agravamento do montante da coima encerra uma verdadeira decisão surpresa, escapando totalmente ao controlo do arguido que fica totalmente desprotegido e à mercê de uma simples reavaliação (de pendor marcadamente subjetivo) do que já foi avaliado por quem para tal tinha competência e, em conformidade, aplicou uma coima de montante determinado. XIX. É à CMVM que compete determinar em que medida é que a coima que aplica é adequada à concreta manu- tenção da “ordem social” que recai no âmbito das suas atribuições.
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