TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
440 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL IV – O Tribunal Constitucional tem entendido que, em processo de contraordenação, para além de gozar do direito de defesa constitucionalmente previsto no artigo 32.º, n.º 10, da Constituição, o arguido goza também do direito de acesso à tutela jurisdicional, com o consequente direito de impugnar judicialmente a decisão administrativa; no entanto, como também tem sido realçado pelo Tribunal, o legislador dispõe de ampla margem de conformação no que respeita à modelação do regime de acesso à via jurisdicional, podendo disciplinar o modo como se processa esse acesso, nomeadamente em via de recurso-impugnação, posto que não crie obstáculos ou condicionamentos substanciais. V – A opção do legislador no que respeita à forma de impugnação das decisões de caráter sancionatório aplicadas em processo de contraordenação por entidades administrativas não foi no sentido de con- sagrar um recurso de mera legalidade ou de cassação, mas antes um recurso de plena jurisdição; com efeito, o tribunal, ao apreciar a impugnação da decisão administrativa, não está vinculado à qualifi- cação efetuada pela entidade administrativa que proferiu a decisão, apreciando quer os factos, quer a matéria de direito; tendo o legislador optado por dar esta configuração ao regime geral da impugna- ção da decisão da autoridade administrativa em processo de contraordenação, não está impedido de, dentro da margem de livre conformação de que dispõe, e face às amplas possibilidades de defesa e de exercício do contraditório conferidas ao arguido no âmbito deste processo de impugnação, afastar em alguns regimes especiais a proibição da reformatio in pejus em relação à decisão da entidade adminis- trativa, como sucede com a norma sob apreciação, impedindo assim que a decisão administrativa se imponha, no que respeita à sanção aplicada, ao tribunal. VI – Perante este quadro processual não há razões para que se considere que o regime em análise consagre um condicionamento excessivo, sendo certo que o recorrente não deixa de ser alertado, como impõe o regime em questão, para a possibilidade da sanção ser agravada, o que impede que seja surpreendido quanto a essa eventualidade, podendo exercer também a sua defesa quanto aos critérios de determina- ção concreta da coima, a ser ponderados pelo tribunal, sendo que essa ponderação não é uma ponde- ração subjetiva, mas baseada em critérios legalmente previstos, estando sujeita a uma fundamentação lógica e racional, de modo a ser controlável, inclusive em sede de recurso para um tribunal superior; além disso, não pode deixar de se ter em consideração que a proibição da reformatio in pejus tem como consequência o aumento do número de recursos interpostos independentemente da gravidade da sanção, podendo comprometer o caráter de simplificação e celeridade do direito de mera ordenação social, tornando os recursos economicamente compensadores sempre que estejam em causa sanções elevadas, por via do diferimento no tempo do respetivo pagamento ou mesmo fazendo protelar o andamento dos autos no sentido de ocorrer a prescrição. VII – Com a opção do legislador, tomada dentro dos seus poderes de livre conformação, não deixa de estar assegurado para a impugnação das decisões da autoridade administrativa em causa um pleno acesso à via jurisdicional, sendo que, pelo tipo de impugnação prevista, garante-se desse modo também a não vinculação do tribunal à decisão administrativa, conferindo-lhe plena independência no que respeita ao exercício da função jurisdicional, não constituindo a possibilidade de agravamento da sanção pela decisão da impugnação um ónus ou obstáculo que restrinja ou dificulte, de modo arbitrário ou des- proporcionado, o acesso à via judiciária por parte do arguido em processo contraordenacional; assim, o regime previsto na norma sob apreciação, enquanto medida necessária e adequada a garantir a tutela
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