TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
421 acórdão n.º 363/15 Ponto é, como referido, que a legislação infraconstitucional, nomeadamente as “cláusulas legais limita- tivas ou excludentes de responsabilidade”, não eliminem nem esvaziem de sentido a garantia da responsa- bilidade direta do Estado (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit. , anot. VII ao artigo 22.º, p. 429, e anot. XVIII ao mesmo artigo, pp. 437-438; no mesmo sentido, vide Jorge Miranda e Rui Medeiros, ob. cit. , anot. XII ao artigo 22.º, pp. 480-481) e não sejam arbitrárias ou desproporcionadas. 9. A efetivação da responsabilidade por erro judiciário implica o reexercício da função jurisdicional relativamente à mesma questão de direito ou de facto: uma primeira decisão judicial é considerada errada por um ato jurisdicional subsequente. Assim, num caso como o que é objeto do presente recurso, constituirá sempre condição necessária da procedência de uma eventual ação de indemnização, a verificação – ainda que a título meramente incidental – de que a pretensa decisão danosa incorreu num erro de direito – in casu a aplicação de uma norma inconstitucional –, verificação essa que obriga a uma nova apreciação da questão de direito – ou seja, no caso vertente, a um segundo juízo sobre a constitucionalidade da norma aplicada pela primeira decisão. Tal reexercício pode ocorrer no âmbito de um recurso ordinário interposto da primeira decisão ou fora dele. E é esta segunda hipótese que, desde sempre tem suscitado as maiores dificuldades [quanto à primeira – que corresponde, no fundo, à situação prevista no artigo 13.º, n.º 2, do RCEEP –, vide as condições de aplicação analisadas por Carlos Fernandes Cadilha, Regime da Responsabilidade Civil (…), cit. , anot. 8 ao artigo 13.º, pp. 274-276, e anot. 9 ao mesmo preceito, pp. 277-280]. Por outro lado, a circunstância de a verificação do erro judiciário exigir o reexercício da função jurisdicional cria naturais interdependências entre o regime constitucional e legal do direito ao recurso e o regime da responsabilidade por erro judiciário (cfr., por exemplo, Carlos Fernandes Cadilha, Regime da Responsabilidade Civil (…), cit., anot. 8 ao artigo 13.º, pp. 272-273]. Como refere Cardoso da Costa, “o instrumento para superar e corrigir a incorreção de decisões judiciais – vale por dizer, o «erro judiciário» – há-de ser primacialmente o do «recurso» (e «reclamação»)”, não o instituto da responsabilidade civil do Estado [vide Autor cit., Sobre o novo regime da responsabilidade do Estado (…), cit., p. 163]. Ou, por outras palavras, “os recursos servem para corrigir decisões e as decisões erradas corrigem-se, não se indemnizam” [assim, a síntese da posição de que discorda feita por Luís Fábrica, Comentário ao Regime da Responsabilidade Civil (…), cit., nota 1.1 ao artigo 13.º, p. 344]. Todavia, como observa Carlos Fernandes Cadilha, pode haver efeitos negativos gerados pelo erro judiciário que não são afastados pelo provimento de um eventual recurso [vide Autor cit., Regime da Responsabilidade Civil (…), cit., anot. 8 ao artigo 13.º, p. 273, nota 474]. Daí o reconhecimento generalizado de especificidades próprias do regime do erro judiciário. 10. Tais especificidades estão na origem de uma orientação seguida por este Tribunal desde o Acór- dão n.º 90/84 (subsequentemente afirmada noutros arestos, como, por exemplo, no Acórdão n.º 71/05), segundo a qual: «Diferentemente de um órgão ou agente administrativo que faz aplicação de uma norma legal, um órgão judicial «diz o direito» – o «direito do caso» –, e a sua declaração é plenamente válida (já acima se recordou) se e enquanto não for revogada, em sede de recurso, por um tribunal superior. Por isso mesmo, se se compreende que um ato «definitivo» da Administração possa ser posto em causa por uma instância judiciária só para efeitos indemnizatórios, não obstante para a generalidade dos efeitos haver entretanto constituído «caso resolvido», com- preende-se do mesmo modo que coisa idêntica não possa suceder com um ato judicial «consolidado». Quer dizer: compreende-se que este último – não havendo sido impugnado, ou, como quer que seja, apreciado pela compe- tente instância de recurso – não possa vir a ser ulteriormente «desautorizado» por outro tribunal (porventura até de diferente espécie, ou pertencente a uma diversa ordem de jurisdição, ou inclusivamente da mesma espécie, mas de grau inferior) mesmo só para aqueles limitados efeitos.»
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