TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
420 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL in Aavv, Comentário ao Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públi- cas, cit., nota 2.1 do Comentário às disposições introdutórias da Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro, p. 40; Vieira de Andrade, Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, 5.ª edição, Almedina, Coimbra, 2012, p. 352; Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, tomo VI, (Direitos Fundamen- tais), 5.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, p. 394; e Tiago Lourenço Afonso, “A responsabilidade civil extracontratual do estado por acto da função jurisdicional” in Revista da Ordem dos Advogados, Ano 74 [2014], pp. 513 e segs., p. 524). Com efeito, é de reiterar a doutrina afirmada no Acórdão n.º 45/99: « [O] o artigo 22.º da Constituição reconhece aos cidadãos o direito à reparação dos danos que lhes forem cau- sados por ações ou omissões praticadas por titulares de órgãos do Estado e das demais entidades públicas, ou por seus funcionários ou agentes, no exercício das respetivas funções, reparação essa que deve ser integral e assumida solidariamente pela Administração. Mas o mesmo artigo 22.º não estabelece os concretos mecanismos processuais através dos quais se há-de exercitar esse direito: ponto é que o legislador, ao fazê-lo, não crie entraves ou dificulda- des dificilmente superáveis, nem encurte arbitrariamente o quantum indemnizatório.» Tal entendimento – a que vai associada a ideia de suficiente determinabilidade a nível constitucional para garantir a aplicabilidade direta do preceito e a invocabilidade imediata do direito nele consagrado – não obsta, todavia, e sem prejuízo da garantia da responsabilidade direta do Estado, que se reconheça uma “larga margem de conformação ao legislador quanto à definição dos pressupostos da responsabilidade do Estado” (assim, vide Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit. , anot. VII ao artigo 22.º, p. 429, que se referem à for- mulação do artigo 22.º da Constituição como “tendencialmente principial”). Jorge Miranda e Rui Medeiros reconhecem igualmente a conveniência de uma intervenção do legislador ordinário (vide Autores cits., ob. cit. , anot. XII ao artigo 22.º, p. 480): «Embora os juízes em geral possam e devam assegurar a tutela do direito fundamental dos lesados à reparação dos danos, uma tal via apresenta inconvenientes, tanto do ponto de vista da separação de poderes e do papel que, num Estado democrático, deve estar reservado ao legislador legitimado democraticamente, como na perspetiva da igualdade e da segurança jurídica. O legislador pode, pois, densificar os pressupostos da obrigação de indemnizar e o regime da responsabilidade, cabendo-lhe designadamente delimitar o conceito de ilicitude relevante e esclarecer em que medida uma ideia de culpa […] constitui pressuposto da responsabilidade. A lei não pode, porém, restringir arbitrária ou desproporcionadamente o direito fundamental à reparação dos danos consagrado no artigo 22.º da Constituição.» A possibilidade de o legislador delimitar e definir o âmbito e os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Estado já foi expressamente reconhecida no Acórdão n.º 683/06. Aliás, a liberdade de conformação em apreço é, nos casos de atos de autoridade ilegítimos, inerente ao caráter secundário da res- ponsabilidade civil em relação à tutela primária dos direitos dos cidadãos assegurada pelas vias impugnatórias ou de condenação à prática de ato de autoridade devido (salienta em especial este aspeto Alves Correia, A indemnização pelo sacrifício: (…) cit. , p. 147; cfr. também o artigo 4.º do RCEEP). E, de todo o modo, a circunstância de os citados atos de autoridade poderem ser praticados no âmbito de qualquer uma das fun- ções do Estado – e é pacífico ser esse o âmbito do artigo 22.º da Constituição (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit. , anot. VIII ao artigo 22.º, pp. 430-431; e Jorge Miranda e Rui Medeiros, ob. cit. , anot. IV ao artigo 22.º, p. 474) –, obriga naturalmente a concretizar a garantia da responsabilidade direta do Estado, de modo a adequá-la à diferente tipologia de atuações que pode estar em causa. Com efeito, são diferentes os problemas suscitados por atos concretos ou atos normativos, assim como também são diferentes as questões colocadas pela ilicitude dos atos típicos de cada função estadual.
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