TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

415 acórdão n.º 363/15 Por acórdão de 2 de dezembro de 2014, aquele Tribunal julgou improcedente a apelação e confirmou a decisão recorrida. Quanto à invocada inconstitucionalidade do artigo 13.º, n.º 2, do RCEEP – que con- siderou ser “a questão fundamental” a resolver no recurso então em causa (fls. 128) – o mesmo Tribunal começou por reconhecer que a exigência estatuída nesse preceito de prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente «[L]imita consideravelmente o exercício desse direito [– o direito a ser indemnizado –], o que equivale, em muitos casos, ao “não direito”, pois, além de ser necessário alegar e provar que a decisão é “manifestamente ilegal ou inconstitucional”, faz depender ainda o exercício desse direito da prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente, o que, por razões várias, nem sempre é possível. Por exemplo, no caso concreto, se se chegasse à con- clusão de que a legislação aplicada (concretamente a aludida portaria) tinha sido revogada e que não era, manifesta e indiscutivelmente, aplicável e que, por isso, o autor deixou de receber uma quantia considerável, parece que, face ao trânsito em julgado da decisão, não poderia exigir o pagamento de qualquer indemnização, por não ter provado a “prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente”.  E isto, repete-se, ainda que seja evidente a ilegalidade da decisão.» (fls. 128-129)  Seguidamente o tribunal a quo apreciou a constitucionalidade daquela norma face ao disposto no artigo 22.º da Constituição, considerando que, não obstante tal artigo conter normas imediatamente aplicáveis e abranger também a responsabilidade do Estado por facto da função jurisdicional, a mesma disciplina “deixa larga margem de conformação ao legislador quanto à definição dos pressupostos da responsabilidade do Estado e constitui uma disciplina normativa aberta ao desenvolvimento judicial do instituto da responsa- bilidade [, sem prejuízo de] a lei ordinária não pode[r] restringir arbitrária ou desproporcionadamente o direito fundamental à reparação dos danos consagrados constitucionalmente” (fls. 131-132). A questão de constitucionalidade foi, assim, equacionada em termos de saber se, à luz do disposto no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição, “a exigência de que ‘o pedido de indemnização deve ser fundado na prévia revogação da deci- são danosa pela jurisdição competente’ constitui ou não uma restrição autorizada do direito previsto naquele artigo 22.°” (fls. 133). A resposta dada no acórdão ora recorrido é a seguinte: «O MP defende que a restrição do n.º 2 do artigo 13.º é constitucionalmente justificada pela necessidade de defender a hierarquia dos tribunais consagrada no artigo 210.º da CRP. A supressão da restrição levaria à subversão dessa hierarquia na medida em que permitiria que um tribunal de comarca julgasse de mérito uma decisão do Supremo Tribunal de Justiça, o que constituiria uma aberração. […] [A] doutrina tem justificado aquela restrição com a força do caso julgado. É que, se a decisão transitou em julgado já é definitiva e por isso não poderá outro tribunal aferir e apreciar a ilicitude dessa decisão, mesmo que não seja com a finalidade de a revogar. Os defensores desta doutrina consideram não ser possível compatibilizar a definitividade da decisão com a pos- sibilidade de a ilicitude da mesma poder ser apreciada incidentalmente para efeitos de determinação da atribuição do direito à reparação de danos que aquela tenha eventualmente produzido. A verdade é que, com a aplicação desta doutrina pode suceder (e muitas vezes sucederá) que a força do caso jul- gado acabe por transformar decisões erradas em decisões formalmente certas e, por via disso, há quem discorde da exigência desta revogação prévia, a qual, na ausência de um meio impugnatório próprio, pode redundar na impos- sibilidade do exercício ao direito de reparação por erro judiciário. Estamos, assim, perante um conflito de direitos: por um lado, a força do caso julgado e, por outro, o direito à indemnização por parte do lesado com a decisão transitada em julgado nos termos referidos. Ou seja, a Constituição concede ao lesado o direito a ser indemnizado. Todavia, por razões de ordem processual, esse direito, em certos casos (e serão muitos), não pode ser exercido. Mas há que reconhecer que com a Lei n.º 67/2007 se deu entre nós um passo significativo no sentido da responsabilidade do Estado e doutras entidades públicas pelos danos decorrentes de decisões jurisdicionais mani- festamente inconstitucionais ou ilegais. […]

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